Grupo étnico está presente em 60 municípios cearenses
Do Site Diário do Nordeste
Por Nícolas Paulino, nicolas.paulino@svm.com.br
FOTO: HELENE SANTOS
Saberes seculares envoltos em misticismo. Para a maior parte da
população, o povo cigano ainda é cercado de dúvidas, até mesmo sobre sua
quantidade exata. Independentemente disso, o fato é que, sem poderem exercer as
atividades culturais que os marcam e lhes garantem renda - dança, música,
culinária e quiromancia, a "leitura" de mãos -, os ciganos também são
afetados, no Ceará, pelo isolamento social recomendado pelo Governo do Estado,
em vigor até dia 20 de abril, como forma de enfrentamento ao novo coronavírus.
Segundo o
presidente do Instituto Povo Cigano do Brasil (ICB), Rogério Ribeiro, há
registros de, pelo menos, 20 mil pessoas vivendo em comunidades ciganas, em 60 cidades
cearenses, divididas em 14 coordenações estaduais. O município de Sobral, na
Região Norte, agrega o maior número de ciganos. São cerca de 500 pessoas,
concentradas principalmente no bairro Sumaré e na Fazenda Joelma. Nos dois
locais, vivem 153 pessoas, das quais 14 são idosas e 38 são crianças.
O líder
local, Paulo Cavalcante, o "Paulo Cigano", afirma que a comunidade
está "rigorosamente cumprindo a lei". Houve uma reunião de
conscientização com os membros dos dois lugares. "Somos família em coração,
sangue e alma. Não temos nenhum caso e esperamos que não tenhamos qualquer
problema", espera o representante que, aos 63 anos, está há mais de 30
dias dentro de casa e já encontra dificuldades financeiras para manter a
própria família.
"Antes,
os homens ciganos viviam da troca e venda de animais. Hoje, a maioria vive mais
de compra e venda de carros e motos. As mulheres sobreviviam com a leitura de
mãos, uma tradição que algumas das mais velhas ainda mantêm. Mas hoje, os
jovens têm firmas, comércios, que estão passando por dificuldades", relata
Paulo Cigano.
Além de
Sobral, a cidade de Pindoretama, na Região Metropolitana, também tem registro
significativo de ciganos - 35 famílias. Em Caucaia, há três famílias na sede e
mais oito na Comunidade dos Trilhos, no distrito de Catuana. Em Fortaleza, eles
estão localizados nos bairros Barroso, Granja Portugal, Henrique Jorge e
Conjunto Ceará.
Fixação
Segundo
Rogério Ribeiro, cigano da etnia calon, a maior preocupação é com a
característica gregária e fixada desse povo no Ceará, ao contrário dos
acampamentos, nomadismo e itinerância característicos de outras regiões do
País. "Aqui, se acontecer com um, pode se alastrar", alerta. Como a
maioria vive de serviços autônomos, também luta para impedir que falte
alimentos nas prateleiras e nas panelas de casa.
O
presidente do ICB critica a burocracia necessária para a garantia de benefícios
sociais e a discrepância de dados oficiais na assistência social aos ciganos.
Segundo ele, dos cerca de 3 milhões de ciganos no Brasil, apenas 26 mil estão
inscritos no Cadastro Único (CadÚnico), instrumento do Governo Federal que
identifica e caracteriza as famílias de baixa renda.
"O
Governo ficou de lançar o aplicativo pra quem não tá no Cadastro Único e muitos
estão no aguardo. Enviamos sugestão ao Ministério da Cidadania pra constar o
campo 'etnia'", afirma.
Segundo Rogério, demandas do povo cigano também
foram enviadas ao Governo do Estado do Ceará, junto com reivindicações de
artistas circenses. "A gente espera que o Governo saia da burocracia.
Nesse momento, precisa ser prático".
Ações
solidárias
Ainda sem
perspectivas de apoio governamental, as comunidades ciganas do Ceará contam com
outras iniciativas de solidariedade. Na última segunda (6), o Núcleo Fortaleza
do Grupo Mulheres do Brasil doou 35 cestas básicas para os moradores de
Pindoretama.
"Estivemos
na comunidade e vimos a necessidade, a carência, em que as mulheres ciganas, de
baixa renda, lutam pela sobrevivência. Passamos a acompanhá-las e ficamos
sabendo das necessidades pela reclusão", destaca a psicanalista Magnólia
Costa, integrante do Grupo.
Antes
disso, no dia 3 de abril, o programa Mesa Brasil, do Serviço Social do Comércio
(Sesc), entregou 150 litros de leite às comunidades do Sumaré e da Fazenda
Joelma, em Sobral.
Comunidades de Fortaleza e Caucaia também receberam
carregamentos de banana por meio do Mesa Brasil.
A
Secretaria da Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos
(SPS) disse que está "em constante contato" com os diversos grupos
étnicos para identificar suas demandas. "Estão sendo adquiridas cestas
básicas para serem entregues a grupos que estejam com essa necessidade
atualmente", garante. Também assegura que a população cigana será
beneficiada com a garantia do pagamento da luz elétrica e água por três meses a
famílias de baixa renda.
"Contato
direto"
O
Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) informou que,
por meio da Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial
(Snpir), está em contato direto com as principais instituições que cuidam de
comunidades tradicionais, como indígenas, ciganos e quilombolas, "reforçando
as medidas de prevenção de contágio ao Covid-19 e arrecadando cestas
básicas".
A
Secretaria disse ainda que está elaborando um diagnóstico nacional da situação
das comunidades tradicionais, para levantar dificuldades e demandas originadas
pela pandemia da Covid-19.
Disponível
em: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/editorias/metro/coronavirus-20-mil-ciganos-no-ce-sao-impactados-pelo-isolamento-1.2232193
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