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domingo, 24 de maio de 2020

Dia Nacional dos Ciganos: resistimos e lutamos por Justiça, liberdade e saúde

Apesar de todas as intempéries e perseguições: nós ciganos resistimos

Por Aluízio de Azevedo e Pimènio Ferreira

No dia 24 de maio se comemora no Brasil o Dia Nacional dos povos e comunidades ciganas. A data foi estabelecida em 2006 por meio do decreto presidencial de 25 de maio de 2006, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, levando em conta o dia de Santa Sara Kali, também comemorado a 24 de maio, ignorando que somos de várias religiões, como muçulmanos, umbandistas, entre outras e não apenas cristãos e católicos.

A história cigana no país, todavia, é muito mais antiga, porém, foi invisibilizada historicamente. O registro da entrada dos primeiros ciganos no Brasil ocorreu em 1574, quando autoridades de Portugal decretaram o degredo do Calon português João de Torres e sua família para a colônia brasileira, justamente pelo “crime” de serem ciganos. Uma prática que se arrastou por todo o período do Brasil-colônia.

Passados 446 anos da chegada de João de Torres em terras tupiniquins e 14 anos da aprovação do Dia Nacional dos Ciganos, somos 500 mil pessoas ciganas brasileiras espalhadas por todos os 27 Estados. Mas enquanto ciganos brasileiros nos perguntamos: o que temos a comemorar?

Se refletirmos que ser Cigano era um crime estabelecido em leis de Portugal e sua colônia durante mais de 300 anos, com punições que iam do degredo, prisões e galés, à violência policial e inúmeros castigos, como a pena de morte, o sequestro de bens e a proibição de praticar/guardar costumes, símbolos e autonomia política como a nossa língua, o Romanon-chibe.

Um dos principais “motes dos reis católicos” era: um só poder, uma só religião, uma só língua, uma só maneira de vestir, de estar e de sentir. Leis anticiganas foram forjadas juntamente com todo um imaginário desumanizante, estereotipado e racista sobre nós, expresso na mídia, na literatura e nas artes, justamente, para legitimar a perseguição e desconsiderando que pertencemos a três troncos étnicos, os Rom, os Calon e os Sinti, com costumes e tradições distintas.

Se considerarmos que no Estado Brasileiro “Independente”, as normativas pró-ciganas só surgiram a partir da Constituição Federal de 1988, que acolheu a todas as “minorias étnicas” como cidadãs, uma garantia que para nós ciganos só ocorreu a partir de 2006, com a criação do dia nacional dos ciganos.

Então, de fato, as comunidades ciganas brasileiras não têm muito o que comemorar sobre o modo como a sociedade e o Estado brasileiro nos tratou. Temos sim muito a comemorar a nossa resistência histórica, que mesmo diante de todas as perseguições, conseguimos defender nossa dignidade e manter nossas próprias culturas, saberes e mitologias milenares.  

Temos muito a mostrar sobre nossos valores, que se expressam, entre outros, pelo reconhecimento dos seres humanos à frente dos bens materiais. Especialmente, no respeito à sabedoria dos mais velhos, no acolhimento das crianças e no reconhecimento das mulheres como centrais para o prosseguimento das nossas culturas.

Temos muito a cobrar como a efetividade de normas pró-ciganas, como a Portaria 4384 de 2018, que reconhecendo a diversidade cultural e especificidades ciganas, cria a política nacional de atenção integral a saúde dos povos ciganos ou a portaria 940 de 2011, dispensando as pessoas ciganas de comprovarem endereço para serem atendidos no Sistema Único de Saúde (SUS).

Comemoramos nosso dia assim: valorizando nossa resistência e exigindo reparação histórica e leis afirmativas que garantam direitos sociais, políticos e econômicos, como cidadãos brasileiros e ciganos que somos. Exigindo que além das normativas, os governos federal, estadual e municipais garantam urgentemente um forte investimento na saúde pública, entre outros serviços essenciais, para garantir vida condigna a todas as pessoas, independente de seus contextos geográficos, sociais e culturais.

Aluízio de Azevedo é Calon, jornalista, mestre em educação ambiental e mitologias ciganas e doutor em Comunicação e Saúde Cigana.

Piménio Ferreira é calon, militante antirracista, graduado e mestre em Engenharia Física, nascido no Brasil e de nacionalidade portuguesa

2 comentários:

  1. que texto importante e belo num momento de tremendas perdas sociais e uma violenta crise na saúde. luta dos ciganos é importante e precisamos somar para que a ética prevaleça!

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    1. Mimi que bom ter o seu e do GPEA apoio e carinho sempre. Nós ciganos somos muito gratos pela parceria e força. Beijos

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