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sexta-feira, 28 de julho de 2017

CRÔNICA: Aprendizagens ciganas: mitos e mistérios





*Por Aluízio de Azevedo, para o site do Centro Burnier

Mora, no sangue cigano, uma canção de pássaros expulsos do Paraíso. Só tiveram tempo de levar consigo: a música e a dança, roupas do corpo abrigo do espírito, cobertor de soluços. Deus logo os chamou de volta para alegrarem de novo as festas do Céu[1].

“Todo cigano pode ser rico o tanto que for. Pode ter muita coisa, ser dono de terra, tudo que pode imaginar. Mas vai chegando perto de morrer, vai perdendo tudo. Tudo que tem. Deus dá, Deus vai tirando, vai levando. Porque Deus não quer nada de nós. E nós não vamos levar nada dessa terra. Tudo que é material fica aqui. O espiritual volta pra Deus. Ele quer a nossa alma, o nosso espírito”. 

A frase acima eu ouvi várias vezes, contadas pelo meu avô, o “seo” Ranulfo cigano.

Em outro momento, um tio-avô, por nome Alvone, me assoprou: “Desde quando eu me entendo por gente, dos começos do tempo, que eu entendo, os ciganos são os párias da sociedade, os marginal...” sentenciando em seguida, “mas todo cigano tem sangue azul, sangue nobre. O sangue cigano é o segredo de tudo. É de onde vem nossas forças e vai nossas memórias, ensinamentos”.

“Pode ter só um pouquinho assim, do tamanho de um dedinho, de sangue cigano, que mesmo assim, ainda é cigano. É que a raça puxa longe”, observa sutilmente d. Alda, ao lembrar como a cultura nunca se perdeu: está baseada na mais fundamental estrutura das sociedades humanas: o parentesco, os laços familiares. Mas sempre confiados em Deus. “O povo cigano é o povo mais de fé que existe. Os ciganos têm força com Deus. Eles são de muita fé”, destaca ela.

Os kalon, Rom e Sinti os três grandes grupos da Romá, ou seja, de todos os ciganos reunidos, fazem contatos espirituais intensos. Emanam energias de todas as tonalidades, cores e sentimentos astrais. 

Passeiam pelos universos sagrados, mas também sabem exercitar o profano. No imaginário popular variam de sensuais, a vagabundos... e assim vamos seguindo, exibindo o mistério que encanta, mas afasta, alegra, mas queima, ensina, mas é refutada.... a identidade cigana, sempre em transmutação, intocável pelos gadjons (não-ciganos).

Até onde a vida nos permitir chegar!

Publicado originalmente em: http://www.centroburnier.com.br/ 




[1] (Ciganos - Poemas em Trânsito. Thesaurus, Brasília, 1998)

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