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quarta-feira, 8 de abril de 2020

Nota Pública: Pesquisadores e Ativistas alertam para racismo contra grupos cigano durante a pandemia e cobram plano emergencial



As Associações ciganas,  grupos de pesquisa, ativistas e pesquisadores abaixo assinados, vêm até as autoridades e órgãos competentes dos governos Federal, Estadual e Municipal; o Ministério Público Federal (MPF); os veículos de comunicação social; e a população brasileira, denunciar o descaso e a forma racista com que algumas cidades brasileiras estão tratando as comunidades ciganas nômades/itinerantes durante a pandemia do Covid-19. Segundo a Associação Social de Apoio Integral aos Ciganos (ASAIC), autoridades municipais de Cachoeira do Sul (RS), Imbituva (PR) e Dois Vizinhos (PR), expulsaram de seus territórios de pouso, na última semana de março, grupos de ciganos Calon que vivem de forma itinerante.

Além disso, na cidade de Guarapuava (PR), no dia 02 de abril de 2020, houve uma tentativa de expulsão de um grupo cigano, mas devido a intervenção do Ministério Publico esta expulsão não pode ser efetivada. As autoridades justificam os seus atos de forma discriminatória, afirmando que  as pessoas ciganas seriam vetores de transmissão do coronavírus.

Ao agir desta forma, as autoridades locais violam os direitos humanos e o acesso à saúde para todos os povos, garantidos pela Constituição Federal de 1988, pelo Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288 de 2010), pela Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (decreto nº 6.040, de 2007); e reforçados pelas orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde.

Mesmo presentes no Brasil desde o início da colonização portuguesa e mesmo tendo  contribuído para a construção das identidades e das culturas nacionais, as comunidades ciganas foram invisibilizadas e sofreram políticas persecutórias e racistas; situação que se mantém na atualidade e o resultado disto é a exclusão social. Vivendo nas periferias, em casas/acampamentos fixos, ou mantendo o nomadismo, em muitos casos as comunidades ciganas não possuem acesso a  territórios com infraestrutura adequada, como serviços de água encanada ou luz elétrica, o que inviabiliza a segurança e as ações de higienização, tão necessárias e recomendadas pelos órgãos e profissionais de saúde.

Ainda existe um alto número de pessoas ciganas que não tiveram acesso à escola e por isso, não foram alfabetizados. Dos poucos que tiveram acesso, uma parte considerável não chegou a concluir o ensino fundamental e são raros os que terminaram o ensino superior . Todos eles sofrem preconceito por parte de instituições estatais e privadas, o que dificulta no processo de integração. Por isto, a maioria vive de comércios informais, como a venda de roupas, enxovais e outras mercadorias; de troca de produtos de segunda mão (gambira/catira);  de leitura de mãos e de tarot; das atividades de circo e parque de diversões que reúnem ciganos e não-ciganos; ou da mendigagem. Todas estas atividades estão suspensas devido ao contato físico e a possível propagação do COVID-19.

Muitos também não possuem acesso à previdência social e existe uma parte que sequer tem registro de nascimento, o que dificulta o acesso a programas como o bolsa família, a partir do CadÚnico. Por isto, milhares de comunidades ciganas estão passando por dificuldades, inclusive alimentares. Além disso, as comunidades ciganas terão de abrir mãos de práticas importantes de suas culturas, como o velório e o luto para ajudar na prevenção ao Covid-19. Agora, cabe aos governantes também fazer sua parte.

Até o momento, o governo federal e os governos estaduais e municipais não elaboraram políticas específicas voltadas para assistir as populações ciganas quanto a prevenção e tratamento relativos ao coronavírus. Também não emitiram orientações de como os membros dessas etnias (Sinti, Kalon e Rom), que somam entre 500 mil a um milhão de pessoas espalhadas por todas as 27 unidades da federação, acessarão as políticas sociais elaboradas para combater a crise socioeconômica causada pela pandemia.

Neste cenário, solicitamos a urgente elaboração de um plano emergencial para atender as pessoas romanis, as populações nômades circenses e as que trabalham em parques de diversão e similares, com políticas específicas de prevenção e combate ao COVID-19. Solicitamos um programa que englobe as questões de saúde articuladas às ações sociais e econômicas – como o programa de renda básica aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado pela presidência da República – e que também preveja a entrega de cestas básicas e materiais e kits de higienização (sabão, álcool, cloro, etc) para as comunidades itinerantes ou em situação de exclusão.

Do ponto de vista da saúde, o plano deverá reforçar o combate ao racismo institucional nas unidades do Sistema Único de Saúde (SUS) e o respeito às políticas de equidade. Como ação urgente, sugerimos que o governo divulgue amplamente a Portaria 940 de 2011 do Ministério da Saúde – que dispensa membros da população romani de apresentar documentos de comprovação de endereço ou o cartão do SUS para serem atendidos em hospitais públicos – assim como  os canais de ouvidoria do SUS para denunciar racismos ou discriminações nos estabelecimentos de saúde, como o número 136,

Aproveitamos a oportunidade para cobrar a implementação da “Política Nacional de Atenção Integral ao Povo Cigano/Romani” (portaria 4.348 de 28 de dezembro de 2018), que estabelece uma série de recomendações, objetivos, diretrizes e competências para governos, estados e municípios para o atendimento às especificidades em saúde das comunidades ciganas, inclusive, na “redução e o combate à ciganofobia ou romafobia”.

Sugerimos que o plano emergencial para o combate ao Covid-19 em prol das populações ciganas deverá ser acompanhado de políticas de comunicação efetivas, que leve informações e orientações em formato audiovisual (áudio ou vídeo) e não em formato de cartilhas ou cartazes, que não surtem efeitos esperados junto a uma população que tem condições educacionais baixas e um alto índice de analfabetismo.

Por fim, nossa carta se junta a outros documentos produzidos neste sentido, como: moção realizada pela Associação Comunitária dos Ciganos do Condado da Paraíba voltada ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e assinada por nove associações e outros pesquisadores; ofício da Associação Internacional Mayle Sara Kali (AMSK/Brasil), destinado à SEPPIR, MPF e SNDCA; ofício da Confederação Brasileira Cigana (CBC) ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos;  Carta do Bispo Diocesano de Eunápolis, Dom José Edson Santana de Oliveira, da Pastoral dos Nômades; e nota da Diretoria do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES) em repúdio à ciganofobia.

Brasília, Distrito Federal, Brasil, 08 de abril de 2020.

ASSOCIAÇÃO COMUNITÁRIA DOS CIGANOS DE JACOBINA-BA (ACCJ)
ASSOCIAÇÃO ESTADUAL DAS ETNIAS CIGANAS DE MATO GROSSO (AEEC-MT)
ASSOCIAÇÃO NACIONAL DAS ETNIAS CIGANAS (ANEC-DF)
ASSOCIAÇÃO SOCIAL DE APOIO INTEGRAL AOS CIGANOS (ASAIC)
ASSOCIAÇÃO DOS CIGANOS DE PERNAMBUCO (ACIPE)
ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL MAYLÊ SARA KALÍ – AMSK/BRASIL E SEUS NÚCLEOS ESTADUAIS.
ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL DA CULTURA ROMANI (AICROM-BRASIL/GO)
ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS ROMANI
CENTRO DE CULTURA E TRADIÇÕES CIGANAS DO RIO GRANDE DO NORTE (ACIGAROM)
CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA CIGANA (CBC)
CENTRO DE DIREITOS HUMANOS E MEMÓRIA POPULAR – NATAL/RN
CENTRO DE ESTUDOS E RESGATE DA CULTURA CIGANA
CERCI -  CENTRO DE ESTUDOS E RESGATE DA CULTURA CIGANA
COMITÊ ESTADUAL DOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS DE MATO GROSSO (CEPCT-MT)
GRUPO DE ESTUDOS CULTURA, IDENTIDADE E CIGANOS (GECIC- UNEB- DCH IV- JACOBINA-BA)
GRUPO DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO – CONSCIENCIA (PPGE-UNB)
GRUPO PESQUISADOR EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL, ARTES E COMUNICAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO MATO GROSSO (GPEA/UFMT)
INSTITUTO DE CULTURA, DESENVOLVIMENTO SOCIAL E TERRITORIAL DO POVO CIGANO NO BRASIL (ICB)
LABORATÓRIO DE ANTROPOLOGIA, POLÍTICA E COMUNICAÇÃO (LAPA/UFPB)
LABORATÓRIO DE ETNOGRAFIA METROPOLITANA -LEMETRO/IFCS-UFRJ
NÚCLEO DE ESTUDOS DE POPULAÇÕES INDÍGENAS (NEPI/UFSC)
PASTORAL DOS NÔMADES
ROMANI FEDERAÇÃO
ROMANIPE - CANADÁ
UNIÃO CIGANA DO BRASIL (UCB)
ZOR - ASOCIACIÓN POR LOS DERECHOS DEL PUEBLO GITANO/ROMANI – ARGENTINA

Alexsandro Castilho – Presidente da Aicrom/BRASIL
Aline Miklos - Cigana, cantora, produtora cultural, doutoranda em História da Arte (EHESS/USP), vice-presidente de ZOR – Asociación por los derechos del Pueblo Gitano/Romani.
Aluízio de Azevedo Silva Júnior – Cigano, jornalista, especialista em cinema, mestre em educação ambiental e mitologias ciganas e doutor em comunicação e saúde, pesquisando as comunidades ciganas no Brasil e em Portugal, membro da AEEC-MT.
Brigitte Grossmann Cairus - Doutora em História, Pesquisadora do Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação - LEER , USP e do Grupo de Pesquisa Ethos, Alteridade e Desenvolvimento - GPEAD da FURB
Camila Gonçalves de Jesus Lopes - Mestre em Educação pela Universidade Estadual de Feira de Santana - UEFS, Membro do Núcleo de Leitura e Multimeios da UEFS, Professora da Educação Básica da rede pública municipal de Camaçari-BA
Cândida Miclos Moco – enfermeira, cigana e ativista pelo direito dos povos romanis.
Carliane  Sandes Alves Gomes - Doutoranda em Geografia Cultura (PPGEO-UERJ) e Bolsista FAPERJ
Cassi L R Coutinho - Doutora em História Social
Gonzalo Damián Cristo – cigano, argentino, presidente de Zor – Asociación por los Derechos del Pueblo Gitano/Romani
Dom José Edson Santana Oliveira – Pastoral Nômade
Edilma do Nascimento J. Monteiro - Doutora em Antropologia pela UFSC e Integrante do Comitê de Antropólogas Negras e Antropólogos Negros da ABA
Elez Bislim – ativista pelos direitos dos povos romanis.
Felipe Berocan Veiga – Chefe do Departamento de Antropologia da UFF
Flávio José de Oliveira Silva - Professor e Pesquisador, Doutor em Educação
Francielle Felipe Faria de Miranda - Docente da ECOM/PUC Goiás e Pesquisadora
Gabriela Marques Gonçalves – Jornalista e Pesquisadora, Doutora em Comunicação
Geysa Andrade da Silva – Docente da Universidade do Estado da Bahia e da Rede Pública do Estado da Bahia, Mestre em Estudos Linguísticos (MEL/UEFS) e doutoranda em Língua e Cultura (PPGLinC/UFBA)
Irandir Souza da Silva ,doutoranda do PPGES/UFSB .Docente da Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC / Ba e participante do grupo de pesquisa Os sujeitos do Atlantico Sul..Pesquiso sobre : Territorios, Ciganidade em comunidades ciganas no litoral Sul.da Bahia.
Inesita Soares de Araujo – comunicóloga, professora doutora do Programa de Pós-graduação em Informação, Comunicação e Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz, Rio de Janeiro) e líder do Laboratório de Comunicação e Saúde (LACES) do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica (ICICT).
Jamilliy Rodrigues Cunha – Doutora da Antropologia pela Universidade Federal de Pernambuco e pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas e Etnicidade – NEPE.
José Ruiter V. Cerqueira Júnior – Leshjae Kumpania
Jucelho Dantas da Cruz – Representante dos Povos Ciganos no Cespct/Sepromi-BA
Juliana Grisolia – Produtora Cultural e Pesquisadora
Juliana Miranda Soares Campos – Antropóloga e Doutoranda na UFMG
Laudicéia da Cruz Santos - Mestra em Educação e Diversidade (MPED/UNEB-DCHIV), Membro do GECIC- Grupo de Estudos Cultura, Identidade e Ciganos (UNEB-DCHIV) e Professora da Rede Pública do Estado da Bahia
Lenilda Damasceno Perpétuo – Secretaria do Estado de Educação do Distrito Federal – SEEDF e Pesquisadora na Comunidade Cigana Calon Nova Canaã / Doutoranda PPGE-UNB
Lucimara Cavalcante Romi – Mestra em Desenvolvimento Sustentável
Maria Patrícia Lopes Goldfarb – Professora de Antropologia da UFPB e pesquisadora das comunidades ciganas na Paraíba – Líder do Grupo de Estudos Culturais (CNPq)
Michel Luiz Kriston – Birevo Kalderash Moldovaia
Márcia Yaskara Guelpa (Yaskara Kalorri) - Presidente do Cerci -  Centro de Estudos e Resgate da Cultura Cigana
Maria do Carmo da S.Medeiros - Centro de Direitos Humanos e Memória Popular, Pastoral dos Nômades, Conselho Estadual de Políticas de Igualdade Racial RN
Mariana Sabino Salazar - Doutorando na Universidade do Texas em Austin / University of Texas at Austin. Voluntaria no Romani Archives and Documentation Center.
Marcilânia Gomes Alcântara Figueiredo- Cigana Calin- Professora da Educação Básica no município de Sousa- Coordenadora do Projeto ‘Contos Ciganos’ e professora/ mestra de dança cigana.
Marco Antonio da Silva Mello – Professor do Departamento de Antropologia Cultural do IFCS-UFRJ
Marcos Toyanski - Doutor em Geografia Humana pela USP, pesquisador e coordenador de projeto sobre ciganos no Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação (LEER/ USP).
Marilene Gomes de Sousa Lima - Doutoranda em Linguística (PROLING/UFPB)
Miriam Geonisse de Miranda Guerra - Docente aposentada da UNEB-DCH IV, Pesquisadora sobre Povos Ciganos e Membro do GECIC-Grupo de Estudos Cultura, Identidade e Ciganos (UNEB-DCH IV)
Pedro Nicolich – Presidente da ROMANI Federação e Academia Brasileira de Letras Romani
Rodrigo Corrêa Teixeira - Programa de Pós-Graduação em Geografia, Departamento de Relações Internacionais - PUC Minas
Ricardo Marcelo Luiz (Marcelo Cigano) – Cigano, músico acordeonista
Sabrina de Souza Lima - Mestra em Educação e Diversidade ( MPED /UNEB- DCHIV), Membro do GECIC/Grupo de Estudos Cultura, Identidade e Ciganos (UNEB_DCHIV), Professora da Rede Pública do Estado da Bahia e do Município de Jacobina-BA
Suzeth Miklos de Freitas – cigana, médica.
Stéphanie Lyanie de Melo e Costa -Doutora em Informação e Comunicação em Saúde

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