A mídia e a ciência são dois campos importantes da sociedade moderna que constroem cotidianamente conhecimento e conteúdos que formam a opinião dos sujeitos e definem alguns parâmetros sobre o que é ser cidadão ou cidadã.
Estes dois campos, com algumas exceções, estão à serviço das classes dominantes reforçando processos que aprofundam desigualdades decorrentes de um modelo patriarcal, racista, classista, homofóbico e colonial de sociedade. Neste sentido, não é difícil encontrar exemplos sobre como a ciência e a mídia representam e refletem sobre as mulheres ciganas em diferentes contextos históricos e geográficos.
No primeiro caso, o racismo científico contribuiu para construir a ideia de inferioridade do povo cigano. Para estes autores, a situação sócio-econômica em que se encontram muitas destas comunidades é consequência do seu modo de vida, de sua cultura, e não dos processos de perseguição, discriminação e pauperização a que são submetidas ao longo da história.
Nestas reflexões, o povo cigano é sempre colocado em contraste e oposição a um padrão de sociedade que segue as normas culturais brancas como um modelo, valorizando e dando poder a tudo que vem delas.
Somada a esta representação geral do povo cigano, temos a contribuição da arte e dos meios de comunicação na construção da imagem da mulher cigana por meio da literatura, da música, do cinema e do jornalismo difundidos em diferentes meios e suportes. Aqui, a mulher cigana é vista, principalmente, de duas maneiras.
Por um lado, a figura
da mulher hipersexualizada, atraente, sensual e de uma beleza ligada ao
“exótico”. Por outro, há a infantilização da mulher cigana, frágil, submissa,
que precisa ser salva, sendo esta visão reforçada também por mulheres
não-ciganas em movimentos feministas maioritariamente brancos.
Tudo isso nos leva a falar sobre o
conceito de interseccionalidade, criado pela pensadora negra Kimberlé Crenshawh
há mais de 30 anos, pensando em como o racismo, o patriarcado e a opressão de
classe têm consequências estruturais na vida de determinadas mulheres que
enfrentam uma situação de vulnerabilidade e desigualdade que lhes dificulta
ainda mais o acesso a bens sociais e coletivos.
Esta realidade nos mostra como a
ciência e a mídia precisam ser repensadas e apropriadas para a construção de
discursos que levem em consideração a ancestralidade a que estas mulheres estão
ligadas, bem como sua cultura e sua história, para a construção de um futuro
onde as mulheres ciganas possam garantir sua autonomia a partir da sabedoria de
seu povo.
Gabriela Marques Gonçalves - jornalista, professora e pesquisadora, com doutorado pela Universidad Autónoma de Barcelona (Espanha) pesquisando o consumo mediático e cultural da população cigana da Catalunha, Membro do coletivo Orgulho Romani.
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