Assessor para Ciência e Comunicação, publica o texto “Decolonizando
a cultura cigana: um ensaio sobre a autorrepresentação e a identidade cigana”
A revista International Journal Of Roma Studies acaba
de publicar o seu terceiro número deste ano. E entre os artigos trazidos pela
publicação científica consta um texto do assessor para ciência e comunicação da
Associação Estadual das Etnias Ciganas de Mato Grosso (AEEC-MT), Aluízio de
Azevedo.
Com o título “Decolonizando a Cultura Cigana: um
ensaio sobre a autorrepresentação e a identidade cigana”, Aluízio aborda no
trabalho a decolonização do conceito de “cultura cigana” e do próprio conceito de
“ciganos” e a importância da autorrepresentação para o rompimento de
estereótipos e preconceitos criados e mantidos no imaginário ocidental sobre as
pessoas romani.
A partir de um mirante teórico dos estudos culturais
latino-americanos, Aluízio propõe sair do conceito tradicional de cultura, para
pensar as relações interculturais, isto é, o contato entre ciganos e
não-ciganos. Além disso, o artigo propõe uma perspectiva decolonial à essa
identidade genérica “cigana”, pensando a como uma luta anticolonial e numa
dimensão política.
A Mestra da Cultura Mato-grossense e mestra da medicina tradicional cigana, Maria Divina Cabral, a Diva, é uma das principais fotografadas para a Exposição Multimídia Calin
A
resistência, a diversidade e a beleza das mulheres ciganas do tronco étnico
Calon que pertencem as comunidades romanis de três municípios: Rondonópolis,
Cuiabá e Tangará da Serra. Este é o tema central que os interessados no
universo romani poderão conferir na Exposição Multimídia Calin, disponível para
ser acessada no link: https://galeriacalin.com.
A
exposição “Calin” é um dos produtos transmídias que integram o projeto “Diva e
as Calins de Mato Grosso: Ontem, Hoje e Amanhã”; aprovado no edital Conexão
Mestres da Cultura, da Lei Aldir Blanc, da Secretaria de Estado de Cultura,
Esportes e Lazer de Mato Grosso (SECEL-MT). Proposto pela Associação Estadual
das Etnias Ciganas de Mato Grosso (AEEC-MT), o projeto homenageia a raizeira e
benzedeira cigana, Maria Divina Cabral, a Diva, como Mestra da cultura
mato-grossense.
Trata-se
da primeira exposição multimídia com foco no universo das mulheres ciganas do
tronco étnico calon no país. Ao trazer as “Calins de Mato Grosso”, o projeto
visa mostrar a diversidade das mulheres ciganas que vivem no Estado, registrar
e valorizar seus valores, tradições e saberes. Também é uma forma de combater
estereótipos e preconceitos sobre as mulheres ciganas.
A negociante Cleide Alves Cabral é filha da Mestra Diva e uma das participantes da Exposição Calin
“O
material multimídia exposto é resultado de um encontro sutil e delicado entre
nossa equipe e o modo como nos vemos, nos mostramos e, principalmente, queremos
ser vistas. Assim, brindamos o público com novas autorrepresentações do
universo romani, especialmente, do tronco étnico Calon. Esperamos que a
plataforma se transforme numa referência nacional, quiçá internacional”, comemora
a presidente ada AEEC-MT e coordenadora geral do projeto, Fernanda Alves Caiado.
O
trabalho registrou mulheres de diferentes idades, propondo novas possibilidades
do que é ser calin, cigana, mulher, mato-grossense, brasileira... A exposição
une as famílias de Maria Divina Cabral, a Mestra Diva e suas parentas Nerana
(Tangará da Serra), Irandi (Cuiabá), Terezinha (Cuiabá) e Nilva (Rondonópolis),
mulheres que também consideramos como mestras da cultura cigana, pois conservam
os saberes, as filosofias e as identidades da cultura cigana.
A estudante de administração da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Taize Aracelli Caiado Siqueira
Conceito
-
Em fotos, vídeos e textos, “Calin” vislumbra a criação de novas narrativas para
que mais e mais mulheres ciganas se inspirem e possam criar os próprios caminhos.
O site é composto por menus explicativos apresentando a exposição, o projeto, a
mestra Diva, as mulheres que participam do trabalho; bem como traz vídeos e
links para o blog e redes sociais da AEEC-MT.
“Apresentamos
um universo ora onírico, ora de realidade, que se revela através da compreensão
feminina de uma cultura milenar de resistência, cuja medicina tradicional se
baseia na natureza. Como as raízes profundas das árvores retorcidas e sertanejas
do cerrado, que resistem ao fogo e a seca, produzindo flores e frutos; as
mulheres ciganas produzem cultura e cura que precisam chegar a mais e mais
pessoas, ainda mais nesses tempos em que vivemos de pandemia, em que a saúde
tornou-se uma questão central”, enfatiza a fotógrafa e curadora, Karen
Ferreira.
A odontóloga Lara Karoline Alves Teixeira e sua filha Laura Teixeira Locatelli – Tangará da Serra
“Calin”
é o modo como as mulheres do tronco étnico Calon se autodenominam. Assim, o
nome da exposição, que também vai no projeto, é também uma forma de promover e
valorizar os saberes ancestrais das mulheres ciganas mato-grossenses.
“A
escolha por este nome sintetiza a desconstrução da palavra “cigana”, na busca
por uma produção em artes visuais dialógica, que de fato represente as Calins a
partir de suas percepções e modos de ver e viver a vida, enquanto ciganas,
trabalhadoras, ativistas, estudantes... Este é um trabalho muito importante
para a quebra de preconceitos e estereótipos que historicamente estiveram
associados às ciganas, mas que são equivocados e racistas” conclui o diretor de
arte e curador da exposição, Rodrigo Zaiden.
Nilva Rodrigues Cunha - Rondonópolis
Produtos
transmídia - A
plataforma virtual da exposição conta com uma abertura que se baseia na
bandeira cigana, cuja roda vermelha que demarca o seu centro, dividindo a parte
azul celeste acima, da verde abaixo. A Galeria Calin abrange quatro salas
principais, a primeira delas, “Diquela Calin”, é composta por 34 fotografias e
abre o site após a abertura animada.
As
outras salas são “Tali Lachin”, “Lage no Mui” e “I Encontro de Mulheres Ciganas
de Mato Grosso”. Este último evento é outro dos produtos transmídias do projeto
“Diva e as Calins” e ocorreu entre os dias 22 e 24 de abril de 2021, em
Rondonópolis, ocasião em que a Mestra Diva ministrou oficinas sobre medicina
tradicional cigana para 15 mulheres das comunidades ciganas de Rondonópolis e
de Cuiabá.
Audelena Dias Cabral é coordenadora do grupo de danças Tradição Cigana - Rondonópolis
O
terceiro e último produto transmídia do projeto Diva é a websérie “Diva e as
Calins de MT”, cujo teaser também está linkado no site da exposição, em
conjunto com outros pequenos vídeos. A websérie é composta por cinco episódios,
com cinco minutos, sendo que cada um deles traz uma mulher cigana, sendo o
primeiro deles, a mestra Diva. As outras mulheres abordadas nos quatro
episódios são: Nerana, Irandi, Terezinha e Nilva.
A resistência, a diversidade e a
beleza das mulheres ciganas do tronco étnico Calon que pertencem às comunidades
romanis de 3 municípios: Rondonópolis, Cuiabá e Tangará da Serra. Este é o tema
central da Exposição Multimídia Calin, disponível para ser acessada no link: https://galeriacalin.com.
A exposição “Calin” é um dos produtos transmídias que
integram o projeto “Diva e as Calins de Mato Grosso: Ontem, Hoje e Amanhã”;
aprovado no edital Conexão Mestres da Cultura, da Lei Aldir Blanc, da
Secretaria de Estado de Cultura, Esportes e Lazer de Mato Grosso (SECEL-MT).
Proposto pela Associação Estadual das Etnias Ciganas de Mato Grosso (AEEC-MT),
o projeto homenageia a raizeira e benzedeira cigana, Maria Divina Cabral, a
Diva, como Mestra da cultura mato-grossense.
Essa é a primeira exposição
multimídia com foco no universo das mulheres ciganas do tronco étnico calon no
país. Ao trazer as “Calins de Mato Grosso”, o projeto visa mostrar a
diversidade das mulheres ciganas que vivem no estado, registrar e valorizar
seus valores, tradições e saberes. Também é uma forma de combater estereótipos
e preconceitos sobre as mulheres ciganas.
“O material multimídia
exposto é resultado de um encontro sutil e delicado entre nossa equipe e o modo
como nos vemos, nos mostramos e, principalmente, queremos ser vistas. Assim,
brindamos o público com novas autorrepresentações do universo romani,
especialmente, do tronco étnico Calon. Esperamos que a plataforma se transforme
numa referência nacional, quiçá internacional”, comemora a presidente ada
AEEC-MT e coordenadora geral do projeto, Fernanda Alves Caiado.
O trabalho registrou
mulheres de diferentes idades, propondo novas possibilidades do que é ser calin,
cigana, mulher, mato-grossense, brasileira. A exposição une as famílias de
Maria Divina Cabral, a Mestra Diva e suas parentas Nerana (Tangará da Serra),
Irandi (Cuiabá), Terezinha (Cuiabá) e Nilva (Rondonópolis), mulheres que também
consideradas mestras da cultura cigana, pois conservam os saberes, as
filosofias e as identidades da cultura cigana.
Conceito
Mestra Diva ministra oficina de medicina tradicional cigana no I Encontro de Mulheres Ciganas de MT ocorrido entre os dias 22 e 24 de abril, em Rondonópolis
Em fotos, vídeos e
textos, “Calin” vislumbra a criação de novas narrativas para que mais e mais
mulheres ciganas se inspirem e possam criar os próprios caminhos. O site é
composto por menus explicativos apresentando a exposição, o projeto, a mestra
Diva, as mulheres que participam do trabalho; bem como traz vídeos e links para
o blog e redes sociais da AEEC-MT.
“Apresentamos um universo
ora onírico, ora de realidade, que se revela através da compreensão feminina de
uma cultura milenar de resistência, cuja medicina tradicional se baseia na
natureza. Como as raízes profundas das árvores retorcidas e sertanejas do
cerrado, que resistem ao fogo e a seca, produzindo flores e frutos; as mulheres
ciganas produzem cultura e cura que precisam chegar a mais e mais pessoas,
ainda mais nesses tempos em que vivemos de pandemia, em que a saúde tornou-se
uma questão central”, enfatiza a fotógrafa e curadora, Karen Ferreira.
“Calin” é o modo como as
mulheres do tronco étnico Calon se autodenominam. Assim, o nome da exposição,
que também vai no projeto, é também uma forma de promover e valorizar os
saberes ancestrais das mulheres ciganas mato-grossenses.
“A escolha por este nome sintetiza a
desconstrução da palavra 'cigana', na busca por uma produção em artes visuais
dialógica, que de fato represente as Calins a partir de suas percepções e modos
de ver e viver a vida, enquanto ciganas, trabalhadoras, ativistas,
estudantes.Este é um trabalho muito importante para a quebra de preconceitos e
estereótipos que historicamente estiveram associados às ciganas, mas que são
equivocados e racistas” conclui o diretor de arte e curador da exposição,
Rodrigo Zaiden.
Para saber mais sobre o projeto “Diva e as Calins de Mato
Grosso: Ontem, Hoje e Amanhã”, acesse a plataforma da Exposição Multimidia Calinou o Blog da AEEC-MT.
Não será necessário comprovante de domicílio no
cadastro do Cartão Nacional de Saúde
Em uma ação interministerial que integra ações nas
áreas de Saúde, Cultura, Educação, Direitos Humanos e Assistência Social em
benefício da população circense itinerante no Brasil, o Ministério da Saúde
amplia o acesso à saúde dessas populações ao identificar a itinerância no
Cartão Nacional de Saúde pelo aplicativo ConecteSUS Cidadão. Assim, pessoas em
situação nômade terão alcance aos serviços sem necessariamente comprovar
endereço.
Para anunciar essa e outras ações, a Secretaria
Especial da Cultura e a Funarte lançam a campanha interministerial “Respeitável
Circo!”, nesta quarta-feira (20). Durante o evento, a Funarte vai apresentar a
cartilha “Respeitável Circo!”, material que busca orientar agentes públicos e
instituições.
Normalmente, quando uma pessoa vai se consultar em uma
Unidade Básica de Saúde (UBS) é exigido comprovante de residência. Para essas
populações, como os circenses, isso acabava sendo uma barreira uma vez que a
itinerância é uma das principais características de sua cultura. Ou seja, essas
pessoas não conseguiam atendimento.
Agora, o Ministério da Saúde vai disponibilizar um
campo no ConecteSUS onde será possível identificar a pessoa, dispensando a
obrigatoriedade da apresentação do comprovante de residência.
A ação visa manter o cuidado contínuo dessas
populações no âmbito da Atenção Primária à Saúde e possibilitar o registro e
acompanhamento da população itinerante pelos profissionais de saúde e os
gestores.
A população circense brasileira compreende mais de 20
mil pessoas, distribuídas em cerca de 800 circos itinerantes de pequeno, médio
e grande porte nas cinco regiões do país.
“Respeitável Circo!”
A campanha interministerial tem a finalidade de
contribuir para o desenvolvimento da atividade artística circense no país e de
qualificar a intervenção dos agentes públicos dos municípios, estados e do
Distrito Federal, na implementação de ações regionais.
É de suma importância que as três esferas de governo -
União, estados e municípios - bem como a sociedade civil, se empenhem na
concretização das ações que visem ampliar a promoção, a atenção e o cuidado em
saúde das populações específicas e em situação de vulnerabilidade social,
materializando os princípios que alicerçam o Sistema único de Saúde (SUS).
Cartilha da campanha Respeitável Circo!
A cartilha da campanha "Respeitável Circo!"
procura facilitar o acesso do artista circense a programas de assistência
social, saúde, educação e, também, estimular o incentivo à formação de público.
Busca ainda auxiliar na redução dos empecilhos de ordem burocrática para a
montagem das lonas nas cidades por onde passam. Na cartilha, são esclarecidos
os direitos, deveres e principais necessidades desses artistas. Ela também
pretende conscientizar os gestores públicos e privados de que o circo é uma
atividade artística e cultural reconhecida por lei e que, como tal, deve ser
apoiada de várias formas.
Ensaio publicado originalmente no E-book "Olhares sobre Educação" uma obra da Editora do Ministério da Saúde.
Obra acima, Mandala das Minorias, que abre a capa do livro, é de autoria de Aluízio de Azevedo, que também assina este ensaio
Resumo
Apresento neste ensaio a metáfora da substituição da mandala pelo
caleidoscópio para refletir sobre as opressões causadas pela globalização
neoliberal aos povos não-europeus, incluindo aí as comunidades ciganas, em seu
eixo civilizacional-cultural. Evidencio que as comunidades ciganas não sofreram
essas violências simbólicas sem lutar. Exemplifico tal cenário apresentando a
“tática do coringa”, uma categoria discursiva anticolonial criada pelas pessoas
romani para se manterem enquanto culturas distintas, mantendo filosofia e modos
de organização próprios, que confrontam os valores de vida ocidentais.
Palavras-chave: Ciganos.
Decolonização. Comunicação e Saúde.
1. Entre táticas e
metáforas: a decolonização da saúde cigana
Esse
texto nasce como uma continuidade das reflexões que teci para ser mediador da
mesa “Educação e Saúde Pública para Minorias: como desenvolver uma sociedade
plural e inclusiva”, que abriu o Ciclo de Debates “Olhares sobre Educação”. O
evento foi organizado pela Área de Ensino e Pesquisa do Hospital Federal dos
Servidores do Estado (HFSE) e ocorreu no dia 10 de setembro de 2020. Nesse
contexto, me foi dada a possibilidade de aprofundar o debate sobre as
comunidades ciganas. Após muito refletir, pensei que este seria um espaço
apropriado para debater sobre a decolonização no campo da comunicação e saúde
para as “minorias”, tendo como foco as comunidades ciganas.
O
farei partindo de uma metáfora que construí na tese de doutorado para
compreender o atual cenário de opressão civilizacional-cultural do ocidente
para com todos os povos não-europeus, incluindo os povos romani. E também o
conceito de “Tática do Coringa”, para representar uma das táticas que as
comunidades ciganas colocaram em prática para não serem assimiladas ou
destruídas. Esta construção se deu a partir de um arranjo epistemológico que se
ancorou em quatro matrizes teórico-metodológicas: os estudos culturais, os
estudos semiológicos, os estudos decoloniais e a filosofia cigana.
Tal
arranjo proporcionou a construção de um saber compartilhado junto ao movimento
e comunidades ciganas, valorizando suas vozes, olhares e conhecimentos, que
foram silenciados ou invisibilizados pelas sociedades ocidentais e a ciência
hegemônica. Os processos de invisibilidade/hipervisibilidade negativa (estereótipos,
estigmas, nomeações, etc.) e as políticas de silenciamento foram duas das principais
estratégias utilizadas pelo colonialismo e capitalismo para a exclusão da
filosofia de vida e os sistemas de ação e organização Calon (também pode ser escrito
“Kalon” ou “Calom” é um dos três grandes troncos étnicos ciganos. Os outros
dois troncos étnicos são os Rom e os Sinti) e desqualificações das comunidades
e pessoas ciganas.
2. A
substituição da mandala pelo caleidoscópio
Na aula
magistral ministrada em 19 de abril de 2017, na Universidade de Coimbra,
Boaventura de Sousa Santos destacou que vivemos um tempo de transição
paradigmática; oportuno para a ocorrência de monstruosidades sociopolítica-econômicas.
Segundo ele, essas monstruosidades se expressam por meio da aplicação da
violência física; e acrescento que também por meio da aplicação de violências culturais-civilizacionais.
Para representar
sinteticamente a esses processos opressores simbólicos, utilizo a mandala, uma
representação geométrica oriental e o caleidoscópio, um aparelho óptico. Simbolicamente,
o atual estágio da sociabilidade global, imposta pelo colonialismo/capitalismo,
mais conhecido como globalização, está trocando a mandala pelo caleidoscópio. A
mandala é uma arte de diversas culturas orientais, como hindus e budistas, sendo
construídas em variadas formas, tamanhos e cores, dispostas ou não de maneira
simétrica a conformar um círculo em expansão que pode ser ampliado infinitamente.
Introduzida
no ocidente nas obras de Jung, para representar a totalidade do self e da
psiquê, em sânscrito, mandala significa círculo e simboliza a unidade nas
alteridades. Sendo aberta e expansiva, sai dos dualismos e acolhe a todos os
elementos, ainda que diversos. Tem fundo artístico espiritual, de respeito
mútuo e reconhecimento. Interliga sem descaracterizar e é entendida como resumo
da manifestação espacial do divino, uma síntese da imagem do mundo. Também simboliza
as leis que governam o cosmos e às quais estão submetidas a humanidade e a
natureza, agregando inclusive o caos.
Já o
caleidoscópio, criado pelo físico escocês Dawid Brewster, é realizado com um
tubo cilíndrico, que mantém uma pequena abertura em um apenas um dos lados,
sendo conformado por espelhos internos e pedras multicoloridas de vidro. Os
espelhos são arranjados de uma forma que se autorrefletem e conforme são
viradas formam múltiplas figuras, dando a impressão que são diferentes. Porém,
sempre se limitam a um número específico de vezes que as pedras são giradas,
modificando o modo como são refletidas.
Esse
aparelho dá a sensação de estar sempre em movimento, conformando novas figuras.
Todavia, está girando em torno de si mesmo e nunca permite configurações
completamente diferentes das que ali são combinadas. Uma ilusão ótica, limitada
aos reflexos e a quantidade de giros do aparelho e a combinação do jogo dos
espelhos, que parece infinito, mas é ordenado, encaixando o olhar em ilusões,
ainda que belas.
Nesta
metáfora, a globalização liberal é uma estratégia do ocidente, assemelhada ao
caleidoscópio, que se constitui de uma parte trânsfuga do oriente, representado
pela mandala, buscando substitui-lo enquanto matriz fundadora civilizacional,
totalizante e antidicotômica, que abarca uma multiplicidade de tempos e mundos
- entre eles o ocidente (SANTOS, 2010). De fato, o ocidente nunca se
transformou num centro alternativo ao oriente, mas tenta se impor aplicando “a
produtividade e a coerção legítima”. Processos que se dão principalmente pela
adoção de um padrão pela ciência e arte modernas obcecadas pela “razão
metonímica” e o conceito de totalidade sob forma de ordem.
Para a visão
científica moderna, toda compreensão não pode ser pensada sem um todo, que tem
soberania sobre as partes, sendo que essas últimas jamais podem destituir o
todo (SANTOS, 2010). O saber científico ocidental e a mídia são espécies de
caleidoscópios. Autorrefletidos como espelhos, acabam girando em torno de si
mesmos, proporcionando diferentes configurações, algumas muito belas, mas
sempre enquadradas dentro de um mesmo formato. Uma das experiências mais claras
das relações dessa configuração ocorre na persistência da colonização epistemológica,
da reprodução dos estereótipos e formas de discriminação, que são como pulsões
escópicas do outro como espelho de si mesmo, que tolera a diversidade, a
integrando para devorar ou o excluir.
3. A Tática
do Coringa
Entretanto,
o oriente e as pessoas ciganas não sofreram esses processos sem lutar. Para combatê-los, resistindo enquanto identidades culturais
e mantendo estilos de vida próprios confrontando modos ocidentais,
desenvolveram a “tática da carta do coringa”. Uma referência aos jogos de
baralho, pensada do ponto de vista do discurso, a tática do coringa envolve
hibridação, camuflagem e mimese. A capacidade, adaptabilidade e maleabilidade
cultural e sócio-organizacional, que se fundamenta na articulação de saberes
tradicionais; com conhecimentos modernos e pós-modernos de ativistas e pessoas
ciganas, inclusive midiáticos e científicos, que nos permitiu resistir como
comunidades distintas aos avanços da colonização/globalização, ora na construção
de identidades miméticas, ora contrastivas.
Enquanto a sociedade ocidental aplicava a estratégia da substituição da mandala pelo caleidoscópio como totalidade do mundo, por meio dos processos de silenciamento, linguicídios, invisibilidade (identidadecídios, apagamento de saberes) e hipervisibilidade negativa (padronização cultural desqualificações por meio de racismos, estereótipos e estigmatizações e inferiorizações); nomeando e classificando toda uma rica alteridade como o genérico “ciganos”, oco e sem vida, demonizado, um reflexo mal refletido de si mesmo, mas projetando todas as suas frustrações e recalques, ódios e rancores; as pessoas ciganas jogam com esse genérico, desenvolvendo táticas de hibridação e mímica.
O coringa se encaixa em todas as posições, podendo compor pares e opostos. Ele pode simbolizar a todas as outras cartas, porém continua sendo o que é: um coringa e não as outras cartas. Tem o poder de assumir todas as composições em um jogo, valendo o que qualquer carta vale, substituindo-a, sem perder seu valor próprio ou a capacidade de simbolizar uma carta diferente noutra composição. Todo coringa é único, nunca um é igual a outro, o que equivale a fórmula nenhum ser humano é igual ao outro.
Diz Bakhtin (2002) que o homem (ou mulher) nunca coincide consigo mesmo (a). A ele (a) não se pode aplicar a fórmula de identidade de A é idêntico (a) a B. E isso simboliza a inconclusividade do ser, compreendendo os lugares de interlocução e identidades culturais que nos são atribuídos, aos quais negociamos dentro de uma elipse que esse genérico permite. Militantes ciganos utilizam a estratégia da invisibilidade, da visibilidade e da hipervisibilidade, como elementos de negociação, articulados a outros fatores, para fortalecer os seus lugares de interlocução.
Um exemplo
comunicacional dessa tática são as articulações que o movimento cigano realiza
junto a veículos da mídia tradicional, para atuar divulgando informações ou
notícias acerca das culturas e identidades ciganas, além de suas demandas
políticas e sociais. Ou utilizam as redes sociais para o mesmo fim, além de
denunciar racismos e opressões. Há inclusive uma disputa entre as várias
associações ciganas em torno da visibilidade própria de cada instituição.
Outro
exemplo científico é o meu caso, que propus esse diálogo de forma acadêmica,
como pesquisador do meu próprio universo cultural, em que a carta do coringa se
expressa nas múltiplas identidades que habitam o meu ser: cigano Calon,
brasileiro, profissional da comunicação e saúde, artista e ativista. Todavia,
não garante melhores lugares discursivos, mas são formas de tornar a luta
conhecida, sensibilizando outras instâncias, como o próprio Estado, com quem
vem dialogando ativamente.
Por Aluízio de Azevedo -Assessor para Ciência e Comunicação da AEEC-MT, doutor em informação, comunicação e saúde (Fiocruz), técnico em comunicação social - jornalista do Ministério da Saúde
Texto publicado originalmente no E-Book "Olhare Sobre Educação" (páginas 40-45). Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/olhares_sobre_educacao_1ed.pdf
REFERÊNCIAS
BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da
Linguagem. São Paulo: Ed. Hucite: 2002.
SANTOS, B.S. Para além do pensamento
abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes. In: Santos B.S e
Meneses M.P. (org). Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez, 2010. p.
31-83.
SANTOS, B.S. Para um novo senso
comum: a ciência, o direito e a política na transição paradigmática. 4a. São
Paulo: Ed. Cortez, 2002.
SILVA JÚNIOR, A. A. (2018). Produção
Social de Sentidos em Processos Interculturais de Comunicação e Saúde: a
apropriação das políticas públicas de saúde para ciganos no Brasil e em
Portugal. (Doutorado em Informação, Comunicação e Saúde). Programa de
Pós-Graduação em Informação e Comunicação em Saúde, ICICT, FIOCRUZ. Disponível
em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/33131. Acesso em: 31/05/2019.
A Editora do Ministério
da Saúde acaba de lançar o E-book “Olhares sobre Educação” (Brasília, 2021). A
obra é uma publicação da Coordenação de Ensino e Pesquisa do Hospital Federal
dos Servidores do Estado (HFSE), em conjunto com a Superintendência Estadual do
Ministério da Saúde no Rio de Janeiro (SEMS-RJ).
As organizadoras do livro
virtual são: Ildenê Guimarães Loula, Pâmela Pinto, Raquel da Silva Teixeira,
Rosamelia Queiroz da Cunha. Também contou com a colaboração de Carla Cristina
Mendes Alferes dos Santos Danielle do Valle Ingrid Vianna Espinosa Rodrigues
O E-book reúne 13 capítulos,
entre eles um escrito pelo pesquisador e servidor do Ministério da Saúde,
Aluízio de Azevedo, com o título “Globalização, ou a Substituição da Mandala
pelo Caleidoscópio” (p. 40-45).
A pintura que ilustra a arte da capa, "Mandala das Minorias", é também de Aluízio.
Assessor para Ciência e
Comunicação da AEEC-MT, no capítulo, Aluízio aborda o tema da globalização e da
padronização cultural imposta por ela às comunidades ciganas, bem como as
táticas de resistência dos romanis, que continuam mantendo suas culturas frente
à colonização cultural.
No resumo do ensaio, o
autor pontua que apresenta no ensaio “a metáfora da substituição da mandala
pelo caleidoscópio para refletir sobre as opressões causadas pela globalização
neoliberal aos povos não-europeus, incluindo aí as comunidades ciganas, em seu
eixo civilizacional-cultural”.
Azevedo também evidencia
no texto “que as comunidades ciganas não sofreram essas violências simbólicas
sem lutar”; exemplificando tal cenário “apresentando a ‘tática do coringa’, uma
categoria discursiva anticolonial criada pelas pessoas romani para se manterem
enquanto culturas distintas, mantendo filosofia e modos de organização
próprios, que confrontam os valores de vida ocidentais”.
Na organização do E-book,
as organizadoras destacam que o livro “é uma exposição de toda a riqueza de
conhecimento expressa por 19 profissionais que, generosamente, aceitaram o
convite da Área de Ensino e Pesquisa (ARENP) do Hospital Federal dos Servidores
do Estado/SAES/MS (HFSE) tanto para falar sobre temas que foram definidos pela
equipe da ARENP, quanto para mediar os debates no ciclo de debates “Olhares
sobre a Educação”.
Ciclo de Debates Olhares
Sobre Educação
O ciclo ocorreu entre 10
de setembro a 29 de outubro de 2020. Foram convidados 16 profissionais cuja
inserção, seja no ensino, na gestão ou na reflexão sobre os temas, poderiam
aprofundar as conversas da equipe. Em 04 de dezembro houve um encontro especial
que contou com mais três palestrantes.
“O entusiasmo e apoio da
Superintendência Estadual do Ministério da Saúde no Rio de Janeiro (SEMS/RJ),
da Assessoria de Comunicação do Ministério da Saúde (ASCOM/MS), da Coordenação
Geral de Divulgação e Informação do Ministério da Saúde (CGDI/MS), do Centro
Cultural do Ministério da Saúde (CCMS) e da Conexão Inovação Pública RJ
possibilitaram a realização desses encontros”, diz um trecho da apresentação.
Foram 20 horas de
exposições e debates muito ricos durante os quais houve, também, grande contribuição
dos mediadores que apoiaram os encontros desse ciclo. Todas as palestras foram
transmitidas em tempo real pelo perfil do YouTube do Conexão Inovação Pública
MINISTÉRIO DA SAÚDE OLHARES SOBRE EDUCAÇÃO 10 RJ, local que também mantém
disponível os vídeos dos encontros.
Texto: Assessoria para Ciência e Comunicação da AEEC-MT
Obra conta com capítulo com foco na experiência do coletivo #OrgulhoRomani e a pauta cigana na comunicação pública
em meio à covid-19
A Intercom – Sociedade Brasileira
de Estudos Interdisciplinares da Comunicação) acaba de lançar o livro “Comunicação
e ciência na era covid-19”, que contém um capítulo abordando a questão cigana
durante a pandemia e a atuação de militantes-pesquisadores vinculados ao
Coletivo Internacional #OrgulhoRomani.
O capítulo “Orgulho Romani” e a
pauta cigana na comunicação pública em meio à covid-19” é assinado por dois dos
três membros do Coletivo: a jornalista, ativista negra e pesquisadora das
comunidades ciganas e a mídia, Gabriela Marques; e pelo jornalista, ativista e
pesquisador da comunicação e saúde, Aluízio de Azevedo, que também é assessor para
ciência e comunicação da Associação Estadual das Etnias Ciganas de Mato Grosso
(AEEC-MT).
O coletivo Orgulho Romani também
é formado pela musicista, cantora, ativista e pesquisadora cigana, Aline
Miklos.
Uma publicação do GP de Políticas
e Estratégias de Comunicação da Intercom, o livro contou com a organização
de suas coordenadoras: Elen Geraldes, Gisele Pimenta, Kátia Belisário, Rafaela
Pinto e Ruth Reis.
Um dos capítulos, o ensaio “Comunicação
popular, meio digital e pandemia: experiência de uma pesquisa-intervenção”, de
autoria de Breno da Silva Carvalho e Ana Gretel Echazú Böschemeier, da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), também abordam em seu texto
um projeto de boas práticas de enfrentamento à covid-19 voltada para
comunidades e movimentos sociais incluindo ciganos, indígenas e quilombolas nos
estados do Rio Grande do Norte, Paraíba e Ceará.
Com 245 páginas e 16 capítulos
com experiências variadas sobre a comunicação pública, a universidade, a
ciência e a pandemia; a obra será lançada nesta quinta-feira (07.10), entre 16h
e17h, na sala 21 da Plataforma do Congresso da Intercom) e será fechada aos
inscritos no evento.
Entretanto, o livro pode se
baixado na página do GP Políticas e Estratégias de Comunicação da Intercom:
Representantes de povos ciganos, pescadores, quilombolas e marisqueiros participarão do evento na próxima sexta-feira (01.10)
O assessor para ciência e comunicação da AEEC-MT, Aluízio de Azevedo,
participará no próximo dia 01 de outubro (sexta-feira), da roda de conversa “Saúde
Planetária: (re) conexões dos Diversos Povos Originários e Tradicionais do
Brasil”.
A roda integra a
XXI Mostra Científica e Cultural da Bahiana (MCC) e ocorre a partir de 16h
(horário de Brasília), de forma aberta, na página do You Tube da universidade: https://youtu.be/5nKxzX1feTQ
Também estarão na roda de diálogo os seguintes convidados: a marisqueira e quilombola da Ilha de Maré, Eliete
Paraguassu; Lourivaldo Kalunga, do movimento negro; Edielso Barbosa, do
movimento de pescadores; o cuidador de pessoas, Ubiraci Pataxó.
A programação tem a
mediação de Flávia Conde Cabral Dias, do movimento de educação popular em saúde
da Bahia e integra a tenda Paulo Freire.
Participam do
evento alunos e pesquisadores de instituições de ensino superior. Neste ano, a
MCC terá como tema "Saúde Planetária na perspectiva dos povos originários
e tradicionais".
O objetivo é
promover atividades práticas e reflexivas que abordarão a saúde planetária e o
cuidado com as vidas, na perspectiva dos povos originários e tradicionais.
Integrarão a
programação da XXI MCC os eventos satélites: XIX Jornada de Iniciação
Científica (PIBIC), XI Fórum de Pesquisadores e VIII Mostra de Extensão.
A Associação Estadual das Etnias Ciganas de Mato Grosso (AEEC-MT) é parceira para a realização da live em comemoração ao "Dia do Cigano no Paraná", uma realização do Conselho Municipal de Políticas Étnico Raciais (COMPER) de Curitiba (PR).
O evento ocorrerá nesta quinta-feira (23.09), às 19h horário de Brasília no canal do Facebook do Conselho Municipal @comperconselhomunicipal e a mediação será realizada pela membro do conselho e representante da Confederação Cigana do Brasil, Nardi Casanova.
Entre os convidados do evento, estão, o assessor para ciência e comunicação da AEEC-MT, Aluízio de Azevedo, que falará sobre a saúde cigana no Brasil e o presidente da Associação Nacional das Etnias Ciganas (ANEC), Wanderley da Rocha, bem como sua secretária, Daiane da Rocha Bian.
No próximo dia 23 de setembro
(quint-feira), às 16h (horário de Brasília), ocorrerá a mesa redonda “Políticas
de Saúde para Povos Ciganos e a Pandemia do Covid-19”.
O evento integra a
programação da IV RAS - Reunião de Antropologia e Saúde (RAS): eventos críticos
e cotidiano de saúde, organizada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
A mesa ocorrerá
de forma online e para ter acesso é necessário estar inscrito na programação da
IV RAS e contará com cinco convidados, entre eles, o Assessor para Ciência e Comunicação da AEEC-MT, Aluízio de Azevedo.
Veja os palestrantes e os temas da mesa:
- Aluízio de Azevedo, com o tema “Pandemia, invisibilidade e preconceito na saúde cigana”;
- Edilma do
Nascimento Jacinto Monteiro, que abordará “Negociações
e gestão da vida entre ciganos calon”;
- Gabriela
Marques, abordando “Cuidados com a saúde, comunicação e povos ciganos: diálogos com Paulo
Freire”;
- Jucelho
Dantas, que palestrará sobre “Histórico do atendimento público de saúde à
população cigana e suas alternativas: aspectos gerais”;
- Marcilânia
Gomes Alcântara Figueiredo, que tratará acerca do tema “A comunidade Cigana
de Sousa x Covid-19: O precário acesso a políticas de saúde”.