sábado, 27 de julho de 2024

Primo perceba quando estiver sendo utilizado como objeto de pesquisa

Texto: Sara Macedo

Arte: Danillo Kalón

Coletivo Ciganagens

É preciso estar atento para que o pensamento de pessoas não-ciganas não contribua para o projeto colonial de nos objetificar, povos ciganos. Estudos nomeados de decoloniais acadêmicos têm colocado que a colonização se deu nos mesmos moldes para todo mundo.


Isso não é verdade, é uma falsa simetria racial. E se uma teoria legitima os esmagamentos e silenciamentos, ela precisa ser questionada. Pois, afinal, são essas teorias que vêm casadas com um tom decolonial, quando adentram nossos saberes e territórios, acabam por se tornarem coloniais em suas práticas. 


Aquilo que acontece com um cigano apenas, nos atinge coletivamente. Para pessoas não racializadas, isso não acontece. Então, há que se estar muito atento ao que é escrito e narrado sobre nós, sem que haja autorização livre e consciente. 


Que condição é esta em que a utilização espontânea ou o trabalho não remunerado podem ser convertidos em indicadores passíveis de objetificação?


Condição que sempre está destinada a povos racializados, essa a de ser um compartilhador de seus conhecimentos em posição gratuita, pois também, nossos saberes não teriam prestígio para remuneração ou então não poderíamos tecer análises teóricas ou conceituais, uma vez que não nos consideram como produtores de conhecimento. 


Há que se refletir sobre a prática de sempre acessar e pegar o que se houve em comunidades e da boca de povos tradicionais, e se coloca em trabalhos, para financiar projetos egocêntricos e individuais sem referência, autoria, troca, retorno, conectividade.


Pura apropriação, mas disfarçada de projeto do diverso e do decolonial. Entretanto, sem nenhum tipo de retorno às comunidades. A categoria “decolonial”, em si própria uma antítese, tem demonstrado que não existe essa história de descolonização. 


“Por que não pergunto a esses povos o que eles querem e desejam que seja pesquisado?”


“Onde nasce esse fascínio antropológico e ascético de sempre precisar retratar, representar, tutelar e “dar voz” a um povo do qual não pertenço?”


Estamos aqui, recusando a partir de agora, migalhas de reconhecimento e afeto pela colonialidade, pois é uma “máscara que cai” e não favorece e dá autonomia para nenhum de nossos primos. Estão acostumados a nos chamar de analfabetos e de pouca sabedoria. Que não entremos nessa grande cilada que criaram para nós. 


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