sábado, 27 de junho de 2020

Povos e comunidades tradicionais de MT solicitam apoio do Estado para mitigar crises pandêmicas

Até o momento o governo do Estado distribuiu 50 mil cestas básicas, insuficientes para atender as 360 mil pessoas que vivem abaixo da linha da pobreza em MT

No último dia 17 de junho (quarta-feira), representantes do Comitê Estadual dos Povos e Comunidades Tradicionais de Mato Grosso (CEPCT-MT) participaram de reunião virtual com a secretária de Trabalho, Ação Social e Cidadania de Mato Grosso (SETASC-MT), Rosamaria Carvalho.

O encontro teve como objetivo discutir os impactos da pandemia junto às populações tradicionais mato-grossenses, que inclui ciganos, indígenas, quilombolas, povos de terreiro (umbanda e candomblé), capoeiras, pantaneiros, retireiros do araguaia, extrativistas, seringueiros, pescadores, ribeirinhos, benzedeiras, danças tradicionais e artesãos. Representantes de 11 secretarias e órgãos do poder público estadual também fazem parte do comitê.

A reunião contou com a mediação do Secretário Executivo do CEPCT-MT, Ivo Gregório de Campos, que representa as comunidades quilombolas e da representante da Unemat, professora Edir Antonia de Almeida, do Centro de Referência em Direitos Humanos Profª Lúcia Gonçalves –(CRDHPLG). E a participação das representantes indígenas Kaianaku Kamaiura e Eliane, da Federação dos Povos Indígenas (FEPOINT) e Mariah, pequena produtora rural.

Participei da reunião como assessor de comunicação e ciência da Associação Estadual das Etnias Ciganas de Mato Grosso (AEEC-MT). Levamos à secretária um diagnóstico situacional (econômico, social e de saúde) sobre como a pandemia causada pelo Covid-19 está impactando a essas populações, bem como apresentamos demandas para a proteção social dessas comunidades, que historicamente sofreram políticas persecutórias, racismo e exclusão.

Também solicitamos apoio para a implementação de uma campanha com dois objetivos: arrecadação de fundos e doações para compra de cestas básicas e kits de higiene para essas comunidades; e a compra de produtos da agricultura familiar e comunidades dos próprios povos tradicionais. Contudo, a esta demanda, Rosamaria da SETASC-MT, afirmou que o Estado já realiza uma campanha e, portanto, não poderá assinar uma outra campanha.

360 mil pessoas vivem abaixo da linha da pobreza em MT

De acordo com a secretária Rosamaria da SETASC-MT, a pasta recebeu pedidos de famílias, comunidades tradicionais, trabalhadores, desempregados e outros tipos de excluídos socialmente. “Temos no Estado um contingente de 360 mil pessoas vivendo em situação de extrema pobreza, ou seja, ganhando uma renda familiar inferior a R$ 89,00 por pessoa residente no domicílio”.

Para ela, “estamos vivendo um momento para o qual não estamos preparados” e, por isso, gestão estadual vem estudando formas para atender as demandas, já que na pasta “chegaram todos os problemas sociais”, considerando, que é “a segunda secretaria mais importante” no enfrentamento as crises instaladas pelo Covid-19, ponderou.

A secretária pontuou que o Estado comprou 50 mil cestas básicas, das quais 26 mil foram distribuídas às secretarias municipais de assistência social. “Distribuímos outras 10 mil arrecadadas com a campanha promovida pela primeira dama e repassamos R$ 8,5 milhões para 141 municípios para a compra de cestas básicas. O governo federal também disponibilizou recursos, mas sabemos que ainda não é suficiente”.

Rosamaria informou ainda que o Estado deverá comprar 100 mil cestas básicas e garantiu que destinará um percentual para atender aos povos e comunidades tradicionais. Mesmo adiantando que não conseguirá atender a toda a demanda das populações tradicionais, se comprometeu a fazer um comunicado aos municípios reforçando a importância em atendê-las com prioridade.

Texto: Aluízio de Azevedo
Assessor para Ciência e Comunicação da AEEC-MT

quarta-feira, 24 de junho de 2020

Uma luta transnacional que merece ser lembrada e reforçada: 24/06 é dia nacional dos ciganos em Portugal

 

Ativistas ciganos portugueses manifestam contra o racismo no último dia 06 de junho
Foto: Rita Alves

*Por Piménio Ferreira e Aluízio de Azevedo

Neste dia, 24 de Junho, comemora-se o dia Nacional das comunidades ciganas em Portugal. A data é apontada por uma mobilização histórica de trabalhadores ciganos para feiras e mercados que marcava os festejos do dia de S. João vindos de vários pontos do País.

Em contraste, hoje não se pode fazer ajuntamentos. Por isso, os trabalhadores precários como feirantes são os mais afectados pela desproteção neoliberal ante a crise pandémica e quando consideramos que trabalhadores ciganos (homens e mulheres, jovens e menos jovens) têm a precariedade laboral como única forma de sustento, percebemos qual o grupo de pessoas mais afectado por esta conjuntura.

Adicionemos agora a precariedade e a segregação habitacional que afecta 80% das famílias ciganas e vemos que os mais afectados são também os menos preparados para responder aos desafios do confinamento e do desemprego.

Este retrato por sua vez, não é um recorte isolado em território nacional. Trata-se de uma realidade transversal em todo o ‘mundo ocidental’, construída às custas do Anticiganismo através das políticas do identarismo ocidental (branco, cristão, aristocrata/burguês, totalitário, imperialista e genocida), que remete as mesmas pessoas para as mesmas situações de discriminação em nome de sustentar os privilegios (económicos, sociais e políticos) das mesmas elites de sempre.

Um Anticiganismo Estrutural e histórico que tem sido confrontado com uma resistência igualmente histórica e transnacional que dura até aos dias de hoje. Do século XIII ao século XXI passando pelo periodo de perseguição anticigana pan-europeia formador da Europa moderna, iniciado no século XV; as ações genocidas e escravocratas do branco europeu sempre foram confrontadas e desafiadas pelas suas vítimas em todos os períodos, nunca tendo sido aceites em tempo nenhum, apenas impostas pela violência.

Já no século XX, homens e mulheres Roma e Sinti de vários Países lutaram unidos contra a Europa Nazi, ora como membros da Resistência Francesa, ora como Partisans, ou soldados do Exército Vermelho, ora como organizações independentes.

Nas últimas manifestações de 6 de Junho em Portugal, por exemplo, vimos pessoas e coletivos antirracistas ciganos na rua em Solidariedade e Luta contra o Racismo e a brutalidade policial. Na mesma altura em que vários coletivos gitanos em Espanha organizaram uma manifestação e a campanha #AntigitanismoMata dedicada a lembrar os atos genocídas do Antigitanismo de Estado.

Entre colectivos e ativistas, pessoas ciganas de vários Países conversam, debatem e organizam-se colectivamente. Projectos como Orgulho Romani, organizado inclusive por um homem cigano no Brasil e uma mulher cigana na Argentina, que promovem as lives ‘Uma cigana me contou’ no instagram, têm colocado em conversa ativistas e artistas ciganos de Espanha, Portugal, Brasil, entre outros Países. Algo que manifesta o caracter transnacional da luta Romani, sempre presente inclusive em todos os Congresso Internacional Romani, uma das iniciativas de organização transnacional realizadas na Europa na história recente.

Mas é acima de tudo nas próprias comunidades que vemos a organização mais potentes: Moradores dos denominados ‘bairros autoconstruidos’ têm se organizado colectivamente, fazendo alianças com outras comunidades ciganas e não ciganas, para lutar pelo direito à habitação condigna. Mulheres, homens, estudantes ciganos têm vindo a desenvolver suas organizações colectivas na luta pela dignidade, pelo direito ao trabalho com segurança, à Educação de qualidade, e resposta a situações emergenciais habitacionais ou sanitárias.

Estas organizações são tão mais relevantes quando vemos os discursos e ações de ódio a serem perpetrados pela extrema direita, com a permeabilidade dos Estados e partidos políticos Liberais brancos e burgueses, que ao mesmo tempo que nos segregam, protegem organizações e cidadãos abertamente racistas que nos perseguem.

Organizemo-nos. Preparemo-nos. Resistamos!

Que neste dia nos lembremos da realidade despriviligiada construída historicamente ao longo destes séculos e ganhemos folego na luta coletiva organizada, com a coragem de assumir o Poder Popular que podemos construir e que é capaz de derrubar regimes e governos injustos por inteiro, como os movimentos antirracistas têm derrubado ícones esclavagistas e figuras do Poder Identitário branco – como o derrube da Estátua de Roosevelt em Nova Iorque. E que nos lembremos que homens, mulheres e jovens ciganos também participam da História da Libertação da Humanidade, tal como no passado Roma e Sinti libertaram outros Roma e Sinti, bem como não Roma, das garras do nazifascismo.

A nossa luta é contínua e contra o Colonialismo que se concretiza no Capitalismo, Racismo e Patriarcado, incluindo lgbtfobia, e que se actualiza à medida que vai sendo confrontado e derrotado.

Que continuemos a abandonar as ilusões coloniais de que a libertação está entre o Poder dos que nos oprimem e seus ‘instrumentos de resposta’ institucionais e a acreditar mais no nosso poder colectivo, nas nossas comunidades e nas gentes como nós.

Se há alguem que pode construir um Poder de Resistência contra-dominante, esse alguém somos nós, todas as pessoas que recusamos um Sistema Capitalista, Racista, LGBTfobico e Machista.

*Ativistas Romani da Etnia Calon. Piménio é cigano nascido no Brasil e de nacionalidade portuguesa e Aluízio é brasileiro, com doutoramento sanduíche na Universidade Aberta de Lisboa (UAb).

quarta-feira, 17 de junho de 2020

Bom exemplo: Prefeitura de Rio das Ostras convoca população cigana para atendimento no CadÚnico


Na unidade de Cantagalo os atendimentos acontecem às segundas e quintas, das 9h às 16h.  Em Mar do Norte apenas às segundas das 9h às 16h

Por: Departamento de Jornalismo - ASCOM

A Prefeitura de Rio das Ostras está convocando a população cigana que possa está residindo no Município para se inscrever no Cadastro Único do Governo Federal (CadÚnico) e outros programas e benefícios sociais assistenciais, principalmente no período de pandemia do Coronavírus. O chamamento também consiste em avaliar o estado de vulnerabilidade que estas famílias podem estar passando nesta fase.

A ação também tem o objetivo de avaliar se os ciganos estão cumprindo os protocolos sanitários da Organização Mundial de Saúde (OMS), como lavar as mãos regularmente com sabão e de forma correta; uso do álcool em gel; distanciamento em locais públicos e isolamento social.

Os atendimentos à população cigana acontece nas Unidades do Centro de Referência de Assistência Social (Cras) no Âncora, Nova Cidade, Cidade Beira-Mar e Rocha Leão às segundas, terças, quintas e sextas, das 9h às 16h.

Na unidade de Cantagalo os atendimentos acontecem às segundas e quintas, das 9h às 16h.  Em Mar do Norte apenas às segundas das 9h às 16h.

O chamamento está acontecendo depois que a equipe técnica da Secretaria de Bem-Estar Social fez um levantamento dos locais de assentamentos por meio das famílias que já estavam registradas no CadÚnico.

Os servidores fizeram um levantamento do povo cigano através do CadÚnico e prontuários, a fim de localizar os endereços de acampamentos e referenciamento aos Centro de Referência de Assistência Social. A partir daí realizou busca ativa aos endereços e não foi localizado.

Ao fazerem as visitas os servidores não encontraram estes cidadãos, o que estimulou a convocação da população ao atendimento presencial.

 “Toda a população é importante para nós! Muitas vezes precisamos ir até eles para levantar as demandas necessárias que estão precisando neste momento. Estamos diante de um momento muito difícil da maior crise sanitária dos últimos cem anos e temos que ajudar a preservar tantas vidas”, disse Eliara Fialho, secretária de Bem-Estar Social de Rio das Ostras.


sábado, 6 de junho de 2020

Livro mostra os impactos do coronavírus nas populações em situação de desigualdade



Realizada por pesquisadores da UFMT, obra traz capítulo escrito pelo Assessor para Ciência e Comunicação da AEEC-MT que aborda povos ciganos

Com o objetivo de ofertar um breve panorama sobre 22 grupos sociais em situação de vulnerabilidade durante a pandemia, o Grupo Pesquisador em Educação Ambiental, Comunicação e Arte (GPEA) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) lançou nesta sexta-feira (05.06), data em que se comemora o dia internacional do meio-ambiente, o livro “Os condenados da pandemia”.

A obra visa debater a desigualdade social, que faz com que a COVID-19 afete mais gravemente cidadãos que habitam regiões socioeconômicas desfavorecidas. Além disso, apresenta a COVID-19 não como um fenômeno natural, mas como resultado de uma ação antropogênica, com destaque para os seres humanos destruindo o ambiente.

O primeiro capítulo traz um cenário abrangente da conexão entre a pandemia e a ecologia. E os que seguem estão divididos em seções de diversos grupos, com questões familiares, que abordam a violência doméstica contra mulheres, pedofilia e negligência com idosos, identidade, com destaque para grupos mais acometidos pela COVID-19. Entre eles ciganos, indígenas, negros e LGBT+, e os trabalhadores, apresentando a precarização do trabalho e da saúde de profissionais, como entregadores, garis e até os desempregados.

“Nosso objetivo foi tentar denunciar que o coronavírus não tem nada de democrático, ele pode contaminar universalmente, mas as mortes são, na maioria das vezes, de pessoas pobres. Queremos revelar que não bastam notícias ou informações, mas precisamos de um amplo programa educativo que consiga mostrar os perigos de uma pandemia e a razão de os moradores das periferias serem mais atingidos”, explica a coordenadora do GPEA, Michèle Sato.

De acordo com a docente, o dia internacional do meio ambiente foi escolhido para a publicação pelo fato das pessoas desconhecerem que a pandemia é originada pelas destruições ambientais.

“O GPEA tem estudos e pesquisas sobre o clima que comprovam a ação humana. Por isso, deixamos de dizer mudanças climáticas e passamos a usar o termo crise, colapso ou emergência climática para denunciar que existe interferência humana na própria crise civilizatória”, destaca.

Os envolvidos com a produção são pesquisadores do GPEA e do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da UFMT.

O livro pode ser baixado no seguinte link: https://editorasustentavel.com.br/os-condenados-da-pandemia/

Com informações da Ascom da UFMT



RESUMO

Buscamos oferecer um breve panorama de 22 grupos sociais em situação de vulnerabilidade, denunciando que há um falso discurso sobre a “democracia” do coronavírus, na afirmação de que é um vírus que atinge todos, sem distinção de classes. É um erro porque se o contágio for universal, as mortes são localizadas. Na cartografia das desigualdades, a Covid-19 mata principalmente os que habitam a geografia da fome.

Palavras-chave: Pandemia. Grupos expostos. Emergência climática. Educação ambiental.


Saiba Mais:

Entrevista com organizadora da obra, professora doutora Michèle Sato

1. Quais são os objetivos do livro e qual foi a motivação para sua produção?
Nosso objetivo foi tentar denunciar que o coronavírus NÃO tem nada de democrático, ele pode contaminar universalmente, mas as mortes são, na maioria das vezes, de pessoas pobres. O segundo objetivo foi elucidar que a covid-19 NÃO é um fenômeno natural, mas tem ação antropogênica, do ser humano destruindo o ambiente. Finalmente, queremos revelar que não bastam notícias ou informações, mas precisamos de um amplo programa educativo que consiga mostrar os perigos de uma pandemia e a razão dos moradores da periferia serem mais atingidos.

2. Qual foi o fio condutor dos artigos escolhidos para a publicação?
A emergência climática está invisibilizada nas noticias sobre a Covid-19, contudo, é exatamente a destruição das florestas, rios, ou poluição dos ares que forja que o humano se aproxime mais da natureza, invadindo territórios e caçando hospedeiros para comércio cruel. O inimigo maior não é a pandemia, mas o que ameaça a vida no planeta é a destruição ambiental.

3. A quem o livro pode interessar, sejam eles pesquisadores ou a comunidade em geral?
Público em geral, com linguagem mais acessível e muitas imagens atrativas para facilitar a leitura.

4. Por qual motivo a data do dia internacional do meio ambiente foi escolhida?
Porque as pessoas desconhecem, na maioria das vezes, que a pandemia é originada das destruições ambientais. O Grupo Pesquisador em Educação Ambiental, Comunicação e Arte (GPEA) tem estudos e pesquisas sobre o clima que comprovam a ação humana, por isso, deixamos de dizer “mudanças” climática e passamos a usar o termo “crise, colapso, ou emergência” climática, para denunciar que existe interferência humana na própria crise civilizatória.

5. Qual a importância de apresentar as situações de vulnerabilidade vivida por parte da população durante o atual contexto?
Não existe ética de responsabilidade moral ainda na sociedade global, há inúmeras desigualdades, injustiças e violações de direitos humanos. Os grupos não são invisíveis, eles fazem parte dos números do IBG. Contudo, eles são INVISIBILIZADOS pelo mercado. A vida não tem preço, e importa, qualquer que seja a cor. Seja um George Floyd que não consegue respirar, seja um menino Miguel que foi deixado para morrer do 9º. Andar de um apartamento no Recife.

6. A senhora pode destacar 2 ou 3 artigos presentes na obra?
O primeiro capítulo é mais longo porque conseguimos dar um cenário mais abrangente da conexão entre pandemia e ecologia. Daí o restante sãp seções de diversos grupos, agrupados em: A) FAMÍLIA: pessoas pertinho da gente, com violência doméstica contra as mulheres, pedofilia ou negligência com os idosos. B) IDENTIDADE: diversos grupos mais acometidos pela Convid-19, como ciganos, indígenas, negros, LGBT+ e demais grupos. E C) são os trabalhadores como entregadores, gari, supermercados e inclusive os “desempregados”, que mal possuem condições para comprar máscaras, ter acesso à água limpa, e muito menos “ficar em casa”.  Outras informações podem ser encontradas no blog go GPEA, UFMT: https://gpeaufmt.blogspot.com/