Por Bruno
Alfano — Rio de Janeiro - 15/09/2025 03h30 Atualizado há
um dia
A consolidação das cotas
para pessoas negras, indígenas, de baixa renda e de escolas públicas nas
universidades brasileiras tem gerado uma diversificação dos públicos atendidos
nas reservas de vagas. Grupos como ciganos, população do campo, refugiados, presos
e filhos de policiais mortos em serviço passaram a ser beneficiados nos últimos
anos com regras criadas pelas próprias instituições de ensino em diferentes
contextos locais. O caso mais relevante é o de pessoas transgênero, cujo número
de vagas dobrou de 2024 para 2025.
Juntas, a quantidade
total de vagas para cotistas somou 140 mil na última edição do Sistema de
Seleção Unificado (Sisu), momento em que os alunos usam a nota do Exame
Nacional de Ensino Médio (Enem) para concorrerem às vagas nas universidades. Já
a da ampla concorrência passa de 120 mil.
Apenas no Sisu de 2025,
foram 857 vagas destinadas a travestis, transexuais e pessoas não-binárias — o
maior número já registrado desde 2019, quando foram criadas as primeiras
reservas para pessoas trans no sistema de seleção. A maior parte dessas vagas,
no entanto, também exige do candidato um limite de renda e/ou ter estudado em
escola pública. Nove universidades, como a Federal Fluminense (UFF), a Federal
de São Paulo (Unifesp) e a Estadual da Bahia (Uneb), adotaram essa medida no
último ano.
Na UFF, por exemplo, 2%
das vagas de graduação são destinadas às pessoas trans que estudaram em escolas
públicas. Em 2025, isso significou 221 vagas de 132 cursos diferentes. Para
comprovar a autodeclaração, os candidatos precisam ainda “descrever a trajetória
da transição de gênero e o processo de afirmação da identidade de gênero, assim
entendidas como o conjunto de características que compõem a transgeneridade”.
Depois, ainda passam por uma banca de heteroidentificação, formada por pessoas
da comunidade escolar, que confirmará ou não a autodeclaração do candidato.
A Lei de Cotas foi criada
em 2012 e renovada em 2024. Ela prevê que as universidades e institutos
federais devem reservar pelo menos 50% das vagas para pessoas que se formaram
na escola pública. A norma prevê ainda que elas podem ser mais focalizadas, destinando
vagas para autodeclarados pretos, pardos, indígenas, quilombolas e pessoas com
deficiência.
No entanto, as
instituições têm autonomia para criar reserva de vagas para outros grupos além
do que estabelece a lei. Assim, o número de cotas fica maior do que o da ampla
concorrência. A Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), por exemplo,
ofereceu no Sisu deste ano 179 vagas na ampla concorrência e 1,9 mil para
cotistas. Entre elas, estão reserva de vagas para pessoas contempladas na Lei
de Cotas e também grupos definidos pela instituição, como os ciganos. As
universidades estaduais da Bahia, de Feira de Santana (BA) e da Paraíba também
têm cotas, somando 389 vagas, para essa população
Para estar apto, o
candidato cigano precisa ter estudado em escola pública e apresentar uma
autodeclaração, acompanhada de um resumo genealógico (chamado pelo edital de
“memorial étnico autodescritivo”). O documento precisa ser “confirmado e
assinado por duas lideranças de famílias extensas (uma estrutura social própria
da comunidade cigana) que sejam reconhecidas por associações de etnias ciganas
legalmente registradas no Brasil”, segundo o edital.
Grupos minoritários
Além de pessoas trans e
ciganos, o Sisu 2025 também teve 278 vagas reservadas para refugiados, 155 para
professores de escolas públicas, 99 para indígenas aldeados, 73 para população
de campo, 61 para filhos de policiais e bombeiros mortos em serviço, 44 para
surdos e 39 para prisioneiros.
A maior parte das vagas,
no entanto, está reservada para os grupos previstos em lei: negros (83 mil
vagas), indígenas (75 mil), pessoas com deficiência (18,5 mil) e quilombolas
(oito mil). Além de pertencerem a esses grupos sociais, os candidatos muitas vezes
precisam se enquadrar em critérios de renda — que, em geral, é de 1,5 salário
mínimo, mas pode variar — e terem sido alunos de escolas públicas pelo menos no
ensino médio. Algumas instituições também proíbem que o candidato tenha
estudado a partir do 6º ano em colégios privados para estar apto à vaga. Há
ainda um grupo de 16 mil vagas que qualquer aluno formado em escola pública
pode concorrer, independentemente de cor, etnia ou grupo social a que pertence.
Inicialmente contestada,
a reserva de vagas não diminuiu a qualidade da educação no país. Pesquisas
apontam que cotistas obtiveram rendimentos similares em aprendizagem aos demais
estudantes. Além disso, possuem melhores índices de conclusão de curso e menores
taxas de evasão.
Outros grupos
Refugiados
Houve 278 vagas para
refugiados no Brasil, em universidades de Rio, São Paulo e Bahia. Os candidatos
passam por uma comissão que verifica a situação documental deles no Brasil.
Presos
São 39 vagas oferecidas
só na UFSB destinadas a presidiários ou ex-egressos do sistema prisional. Em
2025, 195 concorreram. No entanto, seis cursos, como Artes, não tiveram
candidatos.
Filhos de policiais
Sete instituições
estaduais do Rio, como Uenf e a Faeterj, oferecem cota para filhos de policiais
(civis ou militares) e bombeiros mortos em serviço. São 61 vagas para esse
grupo.
População do campo
Institutos federais do
Sudeste de Minas, de Brasília, da Paraíba e do Amazonas oferecem 73 vagas para
produtores rurais, filhos de empregados rurais ou assentados da reforma
agrária.
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