TRADIÇÃO E IDENTIDADE
Minissérie Diva e as Calins de MT aborda a medicina romani, manifestações culturais e memórias de cinco ciganas que vivem em MT
Em dezembro de 2020, a raizeira e
benzedeira cigana, Maria Divina Cabral, a Diva, 67 anos, foi premiada pela
Secretaria de Estado de Cultura, Esporte e Lazer de Mato Grosso (SECEL-MT),
como mestra da cultura mato-grossense. A calin, modo como as mulheres ciganas
do tronco étnico Calon se autodenominam, foi uma das 70 vencedoras do Edital
Conexão Mestres da Cultura, da Lei Aldir Blanc, com o projeto “Diva e as Calins
de Mato Grosso: Ontem, Hoje e Amanhã”.
Treze meses depois, o projeto,
proposto pela Associação Estadual das Etnias Ciganas de Mato Grosso (AEEC-MT),
encerra com chave de ouro lançando no próximo dia 25 de janeiro, às 19h, no
Cine Teatro Cuiabá, o seu quarto e último produto: a minissérie para a web,
Diva e as Calins de Mato Grosso. Em cinco episódios, a série traz a força, a
beleza e a sabedoria das mulheres
calins, que tanto estruturam suas famílias e comunidades, quanto fazem a
diferença na realidade social do Estado e do país.
Cada episódio enfoca na história de vida de uma mulher
cigana: Diva, sua tia e três primas. Mulheres, que como a raizeira, também são
mestras da cultura cigana, que se ramifica em inúmeros outros elementos
culturais, a exemplo da união familiar, da liderança política, da língua e da
filosofia de vida.
“Em seu conjunto, “Diva e as Calins de MT” aborda aspectos que tange ao
passado, como a vida rural e nômade nas barracas, mais próxima à natureza; os
modos de organização social nas cidades e filosófica que se hibridizam ou
confrontam o estilo de vida das sociedades mato-grossense/brasileira nos dias
de hoje; ou ainda a visão que as mulheres Calins almejam conquistar e/ou
conservar como traços identitários e culturais no futuro”, explica a presidente
da AEEC-MT e produtora executiva do projeto, Fernanda Caiado (de vestido amarelo florido no cartaz).
“Queremos romper com
paradigmas racistas e machistas, a partir de um material transmidiático,
baseado em múltiplas linguagens e ancorado no diálogo com as participantes e nos
modos como elas queriam ser representadas”, explica a diretora de fotografia,
Karen Ferreira. “Unindo as artes e a tecnologia, registramos e fortalecemos os
conhecimentos tradicionais ciganos, que são transmitidos oralmente; por meio de
uma interlocução com Diva e suas parentas - mãe, filhas, netas, bisnetas e
primas, que vivem em três municípios: Rondonópolis, Cuiabá e Tangará da Serra”,
complementa, o diretor e roteirista, Aluízio de Azevedo.
Episódios - O
primeiro episódio adentra ao universo romani trazendo como foco a história de
Diva, que nasceu a 25 de setembro de 1954, em uma barraca, num acampamento na
cidade de Mineiros (GO). Filha de Lázaro
Alves Pereira e Lourdes Rodrigues Pereira, casou-se dentro da tradição cigana,
com o seu primo (filho da irmã do pai), Jair Alves Cabral, construindo e
mantendo um profundo conhecimento da filosofia Calon e seu sistema de ação e
organização sociocultural.
A mestra viveu boa parte de sua vida nos lombos dos
cavalos, trafegando pelos Estados da região Centro-oeste, até fixar residência
com a família e parte de sua comunidade no município de Rondonópolis (a 210 km
ao sul de Cuiabá), onde se concentra a maior comunidade cigana de MT – 150
pessoas. Atualmente, a calin mora em uma modesta residência de apenas três
cômodos, na Vila Poroxo e ajuda a todos que chega com rezas, benzeções,
aconselhamentos e remédios naturais. O principal deles é garrafada, composta
por diversidade de raízes do cerrado, indicada para várias enfermidades.
O segundo episódio traz as narrativas da assistente
social Terezinha Alves (Cuiabá). Prima de Diva, também nascida em uma barraca,
ela foi a primeira calin em MT a cursar o ensino superior, graduando-se em
serviço social na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Uma das
fundadoras e diretora de mobilização da AEEC-MT, Terezinha atualmente
representa os povos ciganos como conselheira do Conselho Nacional de Igualdade
Racial (CNPIR), bem como no Comitê Estadual dos Povos e Comunidades
Tradicionais de Mato Grosso (CEPCT-MT).
O quarto episódio enfoca nas memórias da professora
aposentada, Irandi Rodrigues Silva, de Cuiabá-Tangará da Serra (Cartaz abaixo), exemplo de
superação de todas as barreiras da exclusão e dos estereótipos acerca das
mulheres ciganas. Prima-irmã de Diva, Irandi aprendeu a ler e a escrever o nome
aos 8 anos, com um graveto no chão, após uma moça não cigana casar-se com o seu
tio acompanhar o grupo e ensiná-la. O primeiro contato com lápis e caderno foi
aos 13 anos, quando o pai contratou essa tia para ensiná-la e os seis irmãos o
básico da escrita em casa. Após casar-se estudou, graduou-se e trabalhou 25
anos alfabetizando numa escola estadual.
O quinto e último episódio traz a história de vida da agricultora Venerana Rodrigues Pereira (Tangará da Serra). Tia de Diva, Tia Nerana, como é mais conhecida, é casada com Eurípedes Alves Pereira, é uma das mais respeitadas matriarcas calin em MT. Reconhecida pela amorosidade, pela generosidade e as mãos boas para as plantas, tia Nerana fala sobre como era a vida das mulheres ciganas no passado e como elas atualmente, conseguem estudar e se empregam no mercado de trabalho formal.
Produtos e o projeto – “Diva
e as calins de Mato Grosso: Ontem, Hoje e Amanhã” visa fortalecer a cultura
cigana mato-grossense, por meio da realização de atividades que reconhecem os
saberes das mulheres da etnia Calon, Assim, além de condecorar Diva como mestra da cultura e um prêmio
de R$ 20.000,00 e realizar a websérie, o projeto em torno da raizeira cigana
realizou também outros três produtos.
O segundo produto
cultural foi o “I Encontro de Mulheres Ciganas de Mato Grosso”. Realizado em
abril, o evento contou com a participação de Diva e outras 14 mulheres do seu
ciclo de convívio, que vivem na cidade de Rondonópolis-MT, local de realização
do evento. O encontro contou com duas oficinas que giraram em torno dos saberes
da Mestra Diva, que ensinou às outras mulheres participantes os princípios da
medicina cigana, incluindo fazer uma garrafada à base de ervas do cerrado.
O Encontro foi utilizado
como disparador para auxiliar tanto na realização da série, quanto no terceiro
produto: a exposição virtual multimídia “Calin”, que pode ser acessada no link www.galeriagalin.com.
Todos estes produtos são ancorados nesta plataforma virtual, que é o quarto
produto, agregando também ao sítio eletrônico da Associação Estadual das Etnias
Ciganas de Mato Grosso (AEEC-MT), garantindo a continuação e a divulgação do
projeto.
Texto: Aluízio de Azevedo
Fotos: Karen Ferreira
Assessoria para Ciência e
Comunicação da AEEC-MT
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