sexta-feira, 2 de maio de 2025

Conheça leis que garantem os direitos dos Ciganos no Brasil

Política nacional de saúde e Plano Nacional de Políticas Públicas para povos ciganos integram normativas que garantem os direitos dos Calon, Rom e Sinti

Durante séculos o Brasil somente praticou políticas violentas e de exclusão contra as pessoas ciganas. Foram executadas as mais diversas perseguições, com leis que proibiam as pessoas ciganas de falarem suas línguas, praticarem suas tradições e costumes. Construiu-se um imaginário preconceituoso e estereotipado e invisibilizou-se na história oficial as contribuições ciganas à sociedade brasileira.

Apesar disso, os povos ciganos resistiram e hoje estão vivendo em todos os estados brasileiros, a maior parte em situação de exclusão e desigualdades sociais, efeitos do anticiganismo – o racismo estrutural contra os povos ciganos. A situação, só foi mudar a partir da redemocratização do país, quando pode emergir um movimento social cigano no Brasil e a partir daí começaram a surgir as primeiras políticas públicas afirmativas em prol dos Calon, dos Rom e dos Sinti.

Entre essas políticas, destaca-se o Decreto Presidencial nº 12.128 de 01 de agosto de 2024, que “Institui o Plano Nacional de Políticas para Povos Ciganos”. O decreto é a última normativa publicada pelo estado brasileiro buscando a reparação história, o reconhecimento e a garantia de direitos às pessoas pertencentes as três etnias ciganas.

Mas também há outras importantes, a exemplo do Decreto 6.040 de 2007 que nos reconheceu como povos tradicionais brasileiros, a Portaria 4348 de 2018 do Ministério da Saúde que criou a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Povo Cigano/Romani.

Conheça abaixo as principais políticas que amparam e reconhecem os direitos dos povos Ciganos

Constituição Federal de 1988

A primeira grande e maior lei que nos ampara é a Constituição Federal de 1988, que em seu artigo 215: “O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais”.

No inciso primeiro do mesmo artigo não cita propriamente os povos ciganos, mas informa que o estado deverá proteger os grupos participantes do processo civilizatório nacional, prevendo a valorização, proteção e salvaguarda das diversidades étnicas e culturais, além de prever a garantia do estabelecimento de datas nacionais, que foi o que subsidiou aquela que viria a ser a primeira normativa pró-cigana do Brasil, o que veremos a seguir.

Há outros artigos da CF que também amparam como o Art. 5 "Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade", sem distinção de raça ou etnia, cor, credo, orientação sexual, idade... 

Ministério Público Federal protege pessoas ciganas

A Lei Complementar 75/1993 - atribuiu ao MPF a proteção e a defesa dos interesses das minorias étnicas. Em 1994 o órgão cria a Câmara de Coordenação e Revisão dos Direitos das Comunidades Indígenas e Minorias e inclui as comunidades ciganas. A sexta câmara do MPF é a titular que defende os direitos dos povos ciganos. Qualquer denúncia de violação dos direitos humanos e violências contra os povos ciganos devem ser denunciados ao MPF, inclusive racismo, preconceito, discriminação e exclusão social.

Dia Nacional dos Ciganos: 24 de maio

Somente em 2006, no governo do ex e atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi criada a primeira política afirmativa reconhecendo e valorizando os povos ciganos para a cultura e a sociedade nacionais.

Neste ano, graças a atuação de alguns pioneiros ativistas do movimento cigano brasileiro, como os saudosos Mirian Stanescon (Rommi do Rio de Janeiro - RJ), Mio Vacite (Rom do Rio de Janeiro - RJ) e Claudio Iovanovich (Rom de Curitiba - PR), foi criado o Dia Nacional dos Ciganos, comemorado a 24 de maio, em homenagem ao dia de Santa Sara Kali, a padroeira dos ciganos.

De etnia Rom, Mirian Stanescon foi uma das pioneiras do ativismo cigano no Brasil. Mirian na foto com Santa Sara Kali e o presidente Lula. Dia Nacional foi escolhido em homenagem à Santa.

Ciganos Reconhecidos como Povos Tradicionais

No ano seguinte, em 2007, fomos reconhecidos pelo governo federal, por meio do Decreto Presidencial 6.040, como povos tradicionais brasileiros, ao lado de indígenas e quilombolas, portanto, com direitos garantidos, inclusive de salvaguarda do patrimônio cultural e imaterial, por meio de políticas afirmativas e reparatórias específicas.

Portaria dispensa ciganos de apresentar comprovante de endereço para atendimentos no SUS

Em 2011, o Ministério da Saúde publicou a Portaria 940, que regula o Cartão Nacional do SUS e em seu artigo 23, dispensa as pessoas ciganas em situação de itinerância de apresentar comprovante de endereço para serem atendidos nos serviços do sistema. Assim, é possível exigir que o atendimento ocorra em função da especificidade cultural das pessoas ciganas que têm a itinerância como um modo de vida e trabalho, mesmo, muitas vezes tendo fixado residência, continua as itinerâncias.

Recomendação do MPF regulariza inviolabilidade do lar nas barracas ciganas

Em 2013, o Ministério Público Federal, Procuradoria da República do Estado de Minas Gerais (MPF/MG), publicou a Recomendação nº 81, de 01 de agosto de 2013, abordando a questão da inviolabilidade dos domicílios das comunidades ciganas, especialmente suas tendas.

Nesse entendimento, as policias são obrigadas a reconhecer e a respeitar as tendas ciganas como verdadeiros lares, portanto, só podem ter acesso ao local com ordem judicial, como em qualquer outra habitação brasileira. Caso haja esse tipo de intimidação, é cabível denúncia ao MPF e os policiais podem ser processados. O MPF disponibiliza um link com formulário online para denúncia: https://contecomagente.mpf.mp.br/

Resolução do Conanda garante direitos às crianças e adolescentes ciganas

Em 10 de março de 2016, foi publicada a Resolução nº 181 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente - parâmetros para interpretação dos direitos e adequação dos serviços relacionados ao atendimento da Crianças e dos Adolescentes pertencentes a Povos e Comunidades Tradicionais no Brasil.

Resolução 03 de 16 de maio de 2012 do Conselho Nacional de Educação,

Em 2012, mais especificamente no dia 16, o Conselho Nacional de Educação publicou a Resolução 03, que prevê o atendimento de pessoas ciganas itinerantes nas escolas públicas brasileiras. A resolução diz que as escolas devem se adaptar para atender à diversidade do estilo de vida itinerante de muitos grupos ciganos e inclusive em casos que não tenho comprovação escolar ou de transferência escolar.

Plano Nacional de Segurança Alimentar – 2017 traz metas para povos tradicionais

O Plano Nacional de Segurança Alimentar trouxe metas exclusivas para povos tradicionais, incluindo os povos ciganos. Muitas comunidades ciganas estão abaixo da linha da pobreza, vivendo em exclusão e miséria e são beneficiárias de programas como Cad único, Bolsa Família e recebimento de cestas básicas, entre outros.

Durante a pandemia, essa situação se agravou, devido a impossibilidade do trabalho com as vendas por conta do isolamento social e essa situação ainda tem reflexos negativos nos dias de hoje, aprofundando exclusão.

Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Povo Cigano/Romani garante direitos no SUS

Em 28 de dezembro de 2018, o Ministério da Saúde publicou a portaria 4348 criando a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Povo Cigano/Romani. O Art. 3º da portaria estabelece que a política “tem como objetivo geral promover a saúde integral do Povo Cigano/Romani, respeitando suas práticas, saberes e medicinas tradicionais, priorizando a redução e o combate à ciganofobia ou romafobia”.

A política estabelece responsabilidades para a União, os Estados e Municípios para fortalecer o atendimento das pessoas ciganas no SUS, inclusive, com a aplicação de recursos financeiros, como em seu Art. 2º, eixo VI “garantia da implementação da Política Nacional de Saúde Bucal para o Povo Cigano/Romani, com mais investimentos financeiros e de pessoal nos estados e municípios e propiciar a ampliação e implantação de Centros de Especialidades Odontológicas – CEO”.

Ministra do MIR, Anielle Franco, durante lançamento do Plano Nacional de Política para Povos Ciganos

Plano Nacional de Políticas Públicas para Ciganos

A última política afirmativa publicada pelo governo federal em prol dos Calon, dos Rom e dos Sinti, foi o Decreto presidencial nº 12.128 de 01 de agosto de 2024 - Plano Nacional de Políticas para Povos Ciganos e a Portaria do Ministério da Igualdade Racial (MIR) 194 de 04/11/2024, que Aprova ações e compromissos estratégicos do Plano Nacional de Políticas para Povos Ciganos para o período 2024 a 2027 e institui o seu Comitê Gestor.

As eleições do Comitê Gestor ocorreram e já temos 12 representantes/ativistas representando os povos ciganos no órgão, sendo seis homens e seis mulheres, garantida a representação das três etnias: Calon, Rom e Sinti.

Apesar de inúmeros avanços, o Plano e a portaria ainda são muito restritos (apenas quatro páginas tem o plano e a portaria 12 metas), com muitas ações que atendem demandas específicas e pontuais de algumas comunidades, mas poucas ações que alcancem a totalidade das necessidades e demandas necessárias.

Mas é um avanço e o documento reafirma aos Estados e Municípios a importância da inclusão social dos povos ciganos e o combate aos preconceitos e racismo seculares, além, é claro de valorizar e reconhecer as identidades, memórias, histórias, tradições, saberes e modos de vida das pessoas ciganas e suas construções e contribuições históricas à nação brasileira, uma vez que foram omitidas na história oficial.

Assessoria para Ciência e Comunicação da AEEC-MT 

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