Ocorrerá nos próximos
dias 23 e 24 de abril (sábado e domingo) o I Encontro de Mulheres Ciganas de
Mato Grosso. Organizado pela Associação Estadual das Etnias Ciganas de Mato
Grosso (AEEC-MT), o evento acontecerá na cidade de Rondonópolis (a 220 km de
Cuiabá), cidade com a maior comunidade cigana de MT, em torno de 150 pessoas.
O Encontro integra as
atividades do projeto “Diva e as Calins de Mato Grosso: Ontem, Hoje e Amanhã”,
que homenageia a cigana da etnia Calon, Maria Divina Cabral, como mestra da
cultura mato-grossense.
O projeto foi aprovado no
Edital Mestres da Cultura Mato-grossense da Lei Aldir Blanc, organizada pela
Secretaria de Estado de Cultura, Esporte e Lazer de Mato Grosso (SECEL-MT) e
governo federal. Contando com a
participação de Diva, que vive em Rondonópolis há mais de 40 anos e de outras
14 mulheres do seu ciclo de convívio mais próximo; o encontro contará com duas
programações principais.
A primeira delas será a roda de diálogo “Princípios Introdutórios da Medicina
Tradicional Calon” em que Diva transmitirá o conhecimento de como fazer uma
garrafada para suas filhas, netas e outras mulheres da comunidade cigana
rondonopolitana. As garrafadas são o principal produto da medicina tradicional
cigana e são compostas por plantas do cerrado, principalmente raízes e são
recomendadas para curar vários tipos de doenças, como infertilidade, anemia,
problemas no aparelho digestivo, entre outros.
Já a segunda programação principal
do encontro será a roda de diálogo “Rememorando a Chibe”. Chibe é o modo como
os ciganos brasileiros do tronco calon denominam sua língua, que também pode
ser chamada de romanon ou romanó-kaló. Além de ser o principal demarcador entre
as pessoas ciganas e diferenciador dos não-ciganos, a chibe, atua como uma
tática de defesa, frente a população majoritária, guardando resquícios das
origens e da identidade Calon.
De acordo com a coordenadora geral
do projeto, a também cigana da etnia Calon Fernanda Caiado, as comunidades
ciganas possuem culturas ricas e milenares e um longo histórico de migrações e
conhecimentos acumulados; mas também de expulsões e perseguições, se
constituindo como identidades de resistência.
“Esses saberes são aprendidos na vivência, no cotidiano,
nos rituais, transmitidos de geração em geração oralmente, numa configuração em
que as mulheres são as principais mantenedoras e educadoras. Daí a importância
de implementarmos atividades que reconheçam o importante papel das mulheres na
organização sociocultural Calon”, pondera Fernanda, que também preside a Associação
Estadual das Etnias Ciganas de Mato Grosso (AEEC-MT), proponente do projeto
Diva e as Calins.
“Importante pontuar que estamos
atentas às questões relativas a pandemia. O encontro será realizado em espaço
aberto e respeitará todas as medidas de segurança e higiene relativas ao
Covid-19. Todas as pessoas da equipe e as participantes do projeto serão
testadas para o coronavírus”, informa a produtora do projeto, Nilva Rodrigues.
Registro - O I Encontro de Mulheres Ciganas será todo gravado e será utilizado como
disparador para a realização de dois outros produtos: a exposição virtual
multimídia “Calin” e a websérie etnodocumental “Diva e as Calins”, composta
por cinco episódios. Todos os produtos têm como pano de fundo o
universo da cultura cigana Calon, que integra um dos três grandes troncos
étnicos ciganos – os outros são os Rom e os Sinti –; com foco nos saberes das
mulheres e na medicina tradicional.
“Calin é o modo como as mulheres da etnia Calon se autodenominam. Assim, “Diva
e as Calins de Mato Grosso” mira na r-existência das calins de Mato Grosso, que mantém tradições, sem
perder o “time” da história, lutando para ocupar espaços em todos os
âmbitos da sociedade.
“Rompendo com paradigmas racistas
e machistas, estamos fazendo história em Mato Grosso, que pela primeira vez tem
um material tranmidiático e baseado em múltiplas linguagens com foco nas
mulheres ciganas, suas narrativas e saberes. Partimos da memória e da tradição, mas também da vida
atual e das possibilidades de futuro das mulheres ciganas e suas comunidades”,
destaca a diretora de programação do projeto, e também Calin Terezinha Alves.
Conheça
mais sobre a Mestra Diva
O projeto Diva e as calins de Mato Grosso visa registrar e fortalecer a
cultura cigana, por meio da realização de ações que reconhecem os saberes das
mulheres da etnia Calon, especialmente representadas por Maria Divina Cabral,
que pelos seus serviços prestados à conservação dos saberes ciganos e ao
enriquecimento da diversidade cultural mato-grossense, recebeu a premiação de
R$ 20.000,00.
Maria Divina Cabral, ou Diva,
como é mais conhecida, nasceu a 25 de setembro de 1954, em uma barraca num
acampamento na cidade de Mineiros (Goiás). Filha de Lázaro Alves Pereira e
Lourdes Rodrigues Pereira, casou-se dentro da tradição cigana, com o seu primo
(filho da irmã do pai), Jair Alves Cabral, construindo e mantendo um profundo
conhecimento da filosofia Calon e seu sistema de ação e organização
sociocultural.
A Calin viveu boa parte
de sua vida nos lombos dos cavalos, trafegando pelas cidades dos Estados da
região Centro-oeste, até que no início da década de 70 fixou residência com sua
mãe, pai, irmãos e parte de sua comunidade no município de Rondonópolis (a 210
km de Cuiabá, no sul do Estado).
Mãe de duas filhas, Selma
e Cleide, avó de quatro netas (Lorraine, Suiani, Leidiane e Cristiane) e três
bisnetas (Cristina, Paula e Isabela); atualmente é a principal raizeira e
benzedeira cigana no Estado, mantendo viva a medicina tradicional Calon. Integrante
do conselho de anciãos e membra fundadora da AEEC-MT, Diva é respeitada e
ouvida por todos da comunidade, por sua experiência e sabedoria na condução e
salvaguarda de diversos costumes, narrativas e saberes da filosofia cigana.
Texto: Aluízio de Azevedo
Fotos: karen Ferreira
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